segunda-feira, agosto 20, 2012

NASCEU "FRAGMENTÁRIA MENTE"

Santa Iria de Azóia, 19 de Agosto de 2012 – Esta tarde, decidi a criação de um novo “blog”, FRAGMENTÁRIA MENTE, com a finalidade de substituir o MÚSICA MAESTRO e o VIVER-FOTOGRAFIA.

Pretendo, através de um só “domínio”, continuar a publicar os textos “DO MEU DIÁRIO”, a minha poesia - e também a de outros autores -, e as minhas fotografias.

Conto com todos vós!

sábado, agosto 18, 2012

NOSSA SENHORA DO ALMORTÃO





A Senhora tem vestidos
A oiro e prata bordados,
Que lhe foram of’recidos
Ou por milagres trocados.

Na cabeça usa coroa
De perfeição sem igual.
Foi mandada de Lisboa
P´la rainha de Portugal.

Ali perto da fronteira,
A nossa linda Senhora,
Que não tem queda guerreira
Quis ser nossa protectora.

Ó virgem do Almortão,
Dai-nos voz para cantar!
Dai-nos também devoção
Para o ano cá voltar.

in FRAGMENTOS COM POESIA, Ulmeiro, Lx., 2006







sexta-feira, agosto 17, 2012


SENHORA DO ALMORTÃO

Senhora do Almortão,
Em Idanha tem morada.
Sempre rosa em botão,
Ora rosa , ora encarnada.

A Senhora do Almortão
É santinha recatada.
‘stá naquela solidão
E não se queixa de nada.

A Senhora tem morada,
Numa bonita capela.
Para a Mata ‘stá virada,
Que também é terra dela.

A Senhora do Almortão
É ‘ma rosa perfumada.
Em todo o solo beirão,
Não há outra tão amada.


in FRAGMENTOS COM POESIA, Ulmeiro, Lx., 2005


SENHORA DO ALMORTÃO

Senhora do Almortão,
Ó minha santa adorada!
À vila de Santa Iria
Chega a tua nomeada.

Em Santa Iria De Azóia,
Tens ‘ma rua mui vistosa.
Donde podes ver o Tejo,
Ó Virgem tão virtuosa!



quinta-feira, agosto 16, 2012


Santa Iria de Azóia, 16 de Agosto de 2012 – Terminaram as olimpíadas de Londres, que tiveram momentos verdadeiramente emocionantes, no domínio estritamente desportivo. Terminou uma grande festa do desporto, numa grande capital europeia; porém, há muito que começaram os trabalhos preparativos para a realização das olimpíadas de 2016, numa grande cidade da América do Sul, o Rio de Janeiro.

Por cá, parolamente, ainda se continuam a discutir as medalhas que se podiam ganhar e não se ganharam, as causas dos fracos resultados, a atribuição de culpas, etc. Era bom que os jogos fossem vistos apenas como um tempo de sã competição e convívio, em que uns ganham e outros perdem, naturalmente. E se aceitasse, sem grandes comoções, que os resultados nos jogos olímpicos estão em harmonia com o que se passa nas restantes áreas da vida nacional.

Numa espécie de nota de rodapé, quero aqui deixar um reparo e que é o seguinte: um locutor da RTP, que lê notícias à hora do almoço, dizia, num dos primeiros dias desta semana, que os EUA tinham derrotado a China na conquista de medalhas.

Herdeiros de uma tradição de paz, os jogos olímpicos deveriam inspirar os fazedores de opinião para a necessidade de cultivar a concórdia entre as nações. O uso de uma certa linguagem guerreira significa que o mundo continua em guerra, ainda que não declarada, e desta feita entre os EUA e a RPC. No tempo da chamada guerra fria, os contendores eram os mesmos EUA e a então URSS. Com o desaparecimento da URSS, elegeu-se a China como a outra parte beligerante. Em paz é que não podemos viver, mesmo quando se fala de conquista de medalhas olímpicas. Sim, na luta pela conquista de medalhas, os EUA ganharam à China.

quarta-feira, agosto 15, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 15 de Agosto – Neste dia de assumpção da Virgem, o seguinte à festa laranja do Pontal, de onde nunca vieram boas notícias para Portugal, é bom que estejamos com os pés assentes na Terra, que é aqui que uns sofrem, muitos, e outros, poucos, mamam à tripa forra.
vão sombrios e tristes os dias

O jovem Passos Coelho, que se tem caracterizado por uma imensa sageza, anunciou o começo da viagem para o paraíso já em 2013, exactamente no dia em que ficamos a saber que o desemprego voltou a subir, assim como a queda do produto, para além do que seria espectável.

Corajoso, o jovem Passos Coelho, que este ano quis a festa do seu partido longe dos mirones, num espaço fechado, prometeu a par da viagem para o paraíso novos castigos terreais para os portugueses, para que possam fazer a viagem sem mancha de pecado. Sim, que o jovem, corajoso e sagaz Passos Coelho tem pelos seus concidadãos que mais sofrem uma incomensurável misericórdia.

Não acreditando no fim do mundo - nem tão-pouco na eternidade -, creio firmemente que 2013 será um inferno para mim, e para a generalidade dos portugueses, porque o bafio vindo do Pontal não augura nada de bom.

terça-feira, agosto 14, 2012

DO MEU DIÁRIO

Imagem da Wikipédia

Santa Iria de Azóia, 14 de Agosto de 2012 – Eu gostava de ter um Presidente da República que me representasse, porque acho bem que haja Presidente da República que represente todos os seus concidadãos. Só que Portugal é um país tão peculiar, que até o presidente que os portugueses elegeram por maioria não quer representar a minha excelsa pessoa e mais quinze ou dezasseis por cento de outros portugueses que comigo fazem coro, ou eu com eles, fora do denominado centrão da política portuguesa.

Este presidente, que não soube perdoar aos adversários na hora da vitória, nunca poderá ser o Presidente de todos os portugueses, porque as suas opções políticas e ideológicas têm primazia. Atente-se na composição do Conselho de Estado: quinze ou dezasseis por cento dos portugueses não têm qualquer representante no órgão de consulta do inquilino do Palácio de Belém, porque o senhor não quis escolher, ao contrário do seu antecessor Jorge Sampaio, qualquer representante de partidos à esquerda do PS.

Este presidente, que não quis assistir às exéquias do Nobel Saramago, pretextando que estava de férias coma família, é o mesmo que promulga toda a legislação lesiva dos interesses de quem trabalha e dos que menos têm. Este presidente, que tão bem sabe conjugar o verbo avisar no pretérito-perfeito, é corresponsável por esta política de favorecimento dos poderosos, porque nunca quis exercer os seus poderes a favor da esmagadora maioria do seu povo.

E agora regresso ao meu Camilo, o maior dos mineiros da língua portuguesa.

segunda-feira, agosto 13, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 13 de Agosto de 2012 – Marcelo Rebelo de Sousa, a quem Pedro Santana Lopes já apelidou de “pregador de domingo”, é um comentador isentíssimo, que, domingo após domingo, vai trazendo a luz aos nossos espíritos sempre muito propensos às trevas. Eu por mim estou agradecidíssimo a esta eminência, que, com aquele irrequietismo ainda quase juvenil, me surpreende sempre com os seus brilhantes pensamentos.

Vem este meu aranzel a propósito da celebração de ontem e relativamente a uma situação comezinha, que tem a ver com a vontade do executivo de conceder mais cinco dias de licença para férias aos funcionários do fisco. Que não acha bem e sobretudo pelo ruído que a medida pode produzir e porque os ditos funcionários já têm outras regalias. Não ocorreu ao distinto académico discorrer sobre dois ou três factos relevantes, que aqui deixo à consideração dos meus leitores.

     Um funcionário do fisco pertence, tal com o académico deveria saber -ou convir-lhe-á fazer que não sabe? - a um mundo complexo, onde nem sequer há o princípio da especialização. Funcionário do fisco tem de saber IMI, LGT, BF, IVA, IR, IUC, etc. No entanto, a administração não fornece os meios indispensáveis ao estudo, a tempo e horas; e, quando os fornece são manifestamente insuficientes, obrigando os funcionários a adquirir códigos anotados e outros materiais, para poderem desempenhar melhormente a sua actividade profissional. Chefe de Finanças que se preze gasta muito dinheiro em publicações. E os restantes funcionários também.

     O catedrático também não disse que os funcionários do fisco têm um regime de incompatibilidades, que os impede de exercerem outras actividades, renumeradas ou não, sem prévia autorização da tutela. Nomeadamente a docência, que, curiosamente, é permitida aos dirigentes em horários normais, mas que aos funcionários comuns, quando muito, só em horário pós-laboral. Se aos professores catedráticos fosse imposto um regime semelhante, este universitário talvez não pudesse cantar assim de galo.

      O académico também ainda não ouviu dizer, por exemplo, que o fisco está a vender casas diariamente, colocando famílias no olho da rua. O distinto catedrático não sabe nada do desespero de quem está em vias de perder o seu tecto. Não, ainda não ouviu falar. Nem ouviu falar de casos de agressão física e verbal aos sobreditos funcionários, que são o pão nosso de cada dia. Meter tudo no mesmo saco não me parece uma atitude séria, porque aos funcionário das execuções fiscais de um serviço de finanças não lhe correm os dias placidamente como à generalidade dos comentadores-tudólogos. E depois, os cinco dias só premiavam os funcionários excelentes.

     O popular professor tem razão. Esta  coisa ia fazer ruído; porém, nunca pelas razões que apresentou. Daria ruído, porque um excelente em Vila Velha de Ródão pode ser um medícre em Lisboa e um excelente no Porto pode ser um medícre em Alfândega da Fé. Corria-se o risco de tornar a medida muito controversa.     

     Feito este interim, vou continuar a ler o meu Camilo.

sábado, agosto 11, 2012

DO MEU DIÁRIO

Este aparelho é da PANASONIC,
e é surdo-mudo e funciona bem

Santa Iria de Azóia, 10 de Agosto de 2012 – D. Zita Seabra, que foi destacada militante e dirigente do PCP, veio, com décadas de atraso, denunciar uma putativa espionagem do PCP a organismos governamentais, através da instalação de “escutadores” em aparelhos de ar- condicionado. Fazia esse trabalho uma empresa (cooperativa?), na qual pontificava o senhor Alexandre Alves, militante do PCP e benfiquista, segundo a imprensa.

A pertinente denúncia surgiu, exactamente, quando este governo troca-tintas decidiu rescindir um contrato entre o estado português e uma empresa de Alexandre Alves que se propunha, e propõe ainda, ao fabrico de painéis solares, um investimento muito avultado e que prometia a criação de largas centenas de postos de trabalho. Não sei se tudo seria exequível; porém, não deixa de ser espantoso que apareça a senhora Seabra a fazer aquela denúncia, que deveria ter feito quando soube dos factos.

É certo que Sócrates não é, nem nunca terá sido um poço de virtudes, mas cheira-me que este governo, sem sentido de Estado, rasga os compromissos anteriormente assumidos pela comezinha razão de que os papéis trazem a assinatura de membros do anterior governo. Há aqui um desfazer provavelmente ruinoso para o país, que, sem perda de tempo, a PGR deveria começar a averiguar, penso eu.

Quanto a Zita Seabra está tudo dito. Se o ridículo matasse…

sexta-feira, agosto 10, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 10 de Agosto de 2012 – Li um texto no feicebuque, há cerca de uma hora, que me deixou a pensar. Esqueci o autor mas não quem me permitiu a sua leitura, uma pessoa que prezo e admiro, que lhe juntou ainda algumas linhas da sua lavra. Desde a conclusão da leitura desse texto, onde são ditas com muita crueza puras verdades, fiquei a pensar na minha permanência e uso da dita rede social, que é, indiscutivelmente, o “grande irmão” dos tempos que correm. A partir de hoje irei menos ao feicebuque e quem me quiser ler que me procure noutras paragens. No MUSICA MAESTRO (www.musicamestro.blogspot.pt), por exemplo, que sempre será um espaço mais recatado. E onde não se vai de uma forma tão mecânica.

Os blogues, vistas bem as coisas, são igualmente propícios ao “voyeurisme” ou às “espreitadelas”, mais ou menos furtivas, se preferirem. Basta passar pelos blogues mais famosos para se perceber que há uma quantidade de gente que passa os dias de caixa de comentários em caixa de comentários, usando os mais variados pseudónimos – alguns deles bem abjectos -, para se confirmar o que acabo de escrever. Passarei pelos blogues dos meus amigos com a assiduidade habitual e dedicarei mais tempo a coisas indubitavelmente mais importantes. Vou recomeçar a ler, como outrora o fiz, narrativas nacionais e estrangeiras, que tenho às dezenas à espera de tempo(!). E dessas leituras darei conta neste meu espaço, que há anos e durante vários meses desaparecia e reaparecia, como se alguém quisesse divertir-se à minha conta. Quando topei o estratagema, deixei de fazer alarido e as coisas acabaram por reentrar na normalidade. Espero que tudo decorra, doravante, sem quaisquer sobressaltos.

Haja saúde!

quinta-feira, agosto 09, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 9 de Agosto de 2012 – Acabei de ler o romance A Cidade de Ulisses de Teolinda Gersão, escrito num tom coloquial, que agarra o leitor do primeiro ao último momento. Sob uma aparente simplicidade de processos, Teolinda dá-nos nesta obra algumas histórias de amor, sendo certo que duas sobressaem: a vivida pelo narrador, Paulo Vaz, e por Cecília branco; e, a história em que Lisboa se constitui como amada das personagens antes referidas.

Através do protagonista desta narrativa, Teolinda dá-nos um retrato do Portugal das últimas décadas, não lhe escapando sequer a crise actual e o seu rol de misérias. Artistas de eleição, Paulo Vaz e Cecília são no seu modo de viver duas pessoas absolutamente normais, facto que confere uma inexcedível verosimilhança à narrativa

Através de Paulo Vaz, que parece – parece, porque, na verdade estamos em presença de um longo monólogo -, dialogar amiúde com as restantes personagens, a autora faz a apologia de valores incontestáveis, tais como a liberdade individual e a democracia. É de ler.

Gersão, Teolinda, A Cidade de Ulisses, Sextante Editora, 2ª ed., Porto, 2011.



quarta-feira, agosto 08, 2012

4 QUADRAS

Que porra vem a ser esta
Que nos estão a arranjar?
Esta vida já não presta
E ainda vai piorar?!

Mentirosos, mentirosos!
Estes donos da cidade
Sobem o pão e o leite,
O gás e a electricidade.

Sobe o pão e sobe o leite,
O gás e a eletricidade.
Tudo sobe pra deleite
Da velhinha caridade.

Noutra quadra escrevi porra,
Mas é porra interjeição.
Uns mamam à tripa forra;
Eu registo a indignação.

domingo, agosto 05, 2012


AO CONTRÁRIO DE REIS

De mãos entrelaçadas, vamos, Marta, até à beira rio. E aproveitemos, quais hedonistas inveterados, a mansidão da tarde para nos amarmos, sôfregos, como velhos faunos, que as nossas vidas são breves e o tempo muito veloz.

De mãos dadas, vamos, Marta, até à beira rio. E saibamos desfrutar todos os instantes, e, juntos, ouvir apenas o apressado bater dos nossos corações, indiferentes ao rio e a quem por nós passa.

Amemo-nos, pois, uma e outra vez e outra ainda, para, quando o tal barqueiro vier separar-nos, de nada possamos lamentar-nos, nem de Amor sermos devedores.

De mãos dadas, vamos, Marta, até à beira rio.





sábado, agosto 04, 2012


MOMENTOS

Do cimo desta torre, que ajudei a construir, vejo, para além do casario, uma magnífica ponte sobre um majestoso rio.

Subitamente, ocorrem-me Cesário Verde e as velhas crónicas navais. Gama, nas horas de borrasca, à divina providência implorando; Albuquerque, pequeno, mas firme no seu posto, praças e mais praças conquistando.

Do cimo desta torre, que ajudei a construir, observo agora o risco de fumo do último avião e esqueço-me das velhas crónicas e dos heróis das batalhas navais.

Para além do casario, vejo apenas uma magnífica ponte sobre um rio. Uma ponte magnífica e um rio.

quinta-feira, agosto 02, 2012



NÃO TENHO PALAVRAS SÁBIAS

Não tenho palavras sábias nem virtuosas para vos dizer. Se procurais essas palavras, esta não é a melhor porta para bater; porém, a cidade está repleta de homens sábios e virtuosos, que, certamente, vos dirão as palavras que os vossos corações, generosos, tanto procuram.

Eu só sei falar de cigarras, de potros fogosos e bravios e dos dias calmosos do Verão. E se um conselho meu quereis ouvir, pois bem, aqui o tendes: sede ledos como as cigarras, fogosos e bravios como os potros e desfrutai estes calmosos dias de Verão.

Simplesmente, que o tempo – o inexorável tempo –, se há-de encarregar de fazer o resto.



domingo, julho 29, 2012


INDIFERENTES AO MEU CANSAÇO

Agora, indiferentes ao meu cansaço, vêm filhos de mães de moral imaculada, cujos avós e quiçá os pais abancaram à manjedoura do orçamento, donde provavelmente roubaram para dar às filhas e a esses netos, dizer-me que estou a mais; que sou um inqualificável parasita; que não mereço o pão que como.

A esses bondosos cidadãos, que vão enriquecendo sabe-se lá como e encaixam as crias nos melhores empregos, usando os apelidos dos seus compridos nomes; a esses bondosos cidadãos, que vão fintando as leis para que haja pão e leite e carne e peixe, com abundância, nas suas avantajadas mesas; a esses bondosos cidadãos, que tudo esmifram para aconchegarem mais ainda as suas já farfalhudas contas bancárias; respondo com a veemência do costume: a puta que os pariu!





quinta-feira, julho 26, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 26 de Julho de 2012 – A vida, canta Sérgio Godinho, é feita de pequenos nadas. Falo das vidas comuns como a minha e a da esmagadora maioria dos portugueses. E quem diz de pequenos nadas, também poderia dizer de pequenos gestos. Eu creio que é nos pequenos gestos que os homens se vão distinguindo uns dos outros.

Há dias, na FNAC do Vasco da Gama, uma funcionária atendeu o meu filho, sem um sorriso, ainda que com eficácia e correcção. Paga a conta, o João sorriu-lhe, deu-lhe de novo os bons dias e desejou-lhe a continuação de um bom dia de trabalho. Comentou uns metros mais à frente, que, talvez assim, ela pudesse sorrir a outras pessoas e não ser apenas uma vendedora eficaz e correcta.

Há dias, um amigo meu agradeceu-me um gesto banal, um gesto que pratico desde sempre e com muito prazer. E em bom rigor, o gesto nem lhe era directamente dirigido. Disse ao meu amigo que a generosidade, por enquanto, ainda é gratuita. No fundo, ser capaz de dar espaço e visibilidade aos outros, nomeadamente àqueles de quem gostamos, não custa dinheiro e pode emprestar aos dias e às vidas cores mais sadias.

Não sei se consegui o objectivo a que propus quando comecei a teclar este texto. Se consegui falar claro de pequenos nadas, nomeadamente, de generosidade, falei do maior défice da sociedade portuguesa. Algo que, infelizmente, não se compra ou vende no supermercado.

terça-feira, julho 24, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 23 de Julho de 2012 – Há um sentimento que me é muito caro: a gratidão. Por isso mesmo, não poderia deixar de escrever meia dúzia de linhas, relativamente à sessão de lançamento de QUADRAS POPULARES – UMAS SIM, OUTRAS QUASE, no Cine –Teatro Avenida, na cidade de Castelo Branco, que ocorreu no passado dia 21 do corrente mês de Julho, pelas 18H00.

E essas linhas, que quero de agradecimento, vão para o Prof. Carlos Semedo, que dá alma ao espaço de CULTURA-VIBRA, no Cine-Teatro Avenida, com empenho, saber e simpatia; e vão, também, para a Dr.ª Cristina Granada, que, na sua qualidade de Vereadora da Cultura, me dirigiu palavras de muita simpatia e manifestou interesse pelo “modus faciendi” da quadra popular.

E por fim, agradeço à Patrícia a amizade, a simpatia e a ajuda que nos deu no decurso deste evento simples, que também foi realizado com o seu empenho, que já durava há meses.

Fica a promessa de que havemos de voltar com outro trabalho, mas com uma escolha mais criteriosa do dia da semana, da hora e da época do ano, para que possamos ter uma sessão mais participada. Com Castelo Branco no coração, até sempre!



sexta-feira, julho 20, 2012

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria - Foi outrora uma vila industrial
Santa Iria de Azóia, 20 de Julho de 2012 – Arménio Carlos diz que o verão vai ser quente e eu acredito que sim, porque acredito em Arménio Carlos. E mais ainda na necessidade urgente de dar um combate eficaz a esta gente que nos desgoverna.

O desemprego é, indiscutivelmente, a maior praga que atingiu a sociedade portuguesa. É assim como uma espécie de pandemia e sem remédio à vista. Fazer crescer a economia e criar empregos é o grande desígnio nacional para os próximos anos, mas não é com esta gente que o barco encontrará um porto seguro.

Esta gente que nos desgoverna em nome do capital financeiro e dos grandes empresários - e também dos inabilitados pequenos e médios empresários -, tem todo o interesse em ter legiões de desempregados, a fim de poder ter trabalhadores sem direitos e com salários de miséria. É dos livros. Karl Marx (ou teremos que voltar a escrever Carlos Marques?) continua actual.

Temos que honrar a memória de Ary
O verão vai ser quente. Este verão tem que ser quente. Para defender o que resta depois do “tsunami” que arrasou Portugal nos últimos anos. Para defender um Portugal de e para os portugueses e não um Portugal de banqueiros, comerciantes e industriais “beduínos” que tudo nos querem tirar. E para correr com os mandantes, que apontam aos nossos filhos, despudoradamente, a porta de saída.



terça-feira, julho 17, 2012

DO MEU DIÁRIO

Portugal, um país crepuscular

Santa Iria de Azóia, 17 de Julho de 2012 – Segundo o que ouvi na Antena 1 da RDP, apenas 29% das empresas pagaram impostos sobre lucros (IRC), relativamente ao exercício de 2011. Que terá sido o pior ano, disse o comentador para assuntos económicos, para quem a crise não explica tudo.

Na verdade, o referido comentador disse que a relação nunca foi muito diferente, ou seja, só uma em cada três empresas é que paga imposto sobre lucros, ou seja, o chamado IRC. È assim, efectivamente, há muitos muitos anos e nem o celebérrimo gestor Paulo de Macedo pôs cobro a tal situação.

Dizia o comentador que algo não está bem, porque não sabe como poderiam os sócios e os administradores das empresas suportar prejuízos permanentes. Eu também não. Sei e não é preciso ir a Delfos perguntar as razões pelas quais há tantas empresas em Portugal a dar prejuízo. Dão prejuízos porque a fraude e a evasão fiscais são muito grandes. Sabe-se que a economia informal vale hoje mais de 25% do PIB.

E a tendência é para a fraude e a evasão serem ainda maiores, tendo em conta as altas taxas do IVA. Se se pensar que uma conta de 500 euros de uma prestação de serviços será acrescida de 115 euros de imposto, perceber-se-á de imediato que quem desembolsa prefere pagar 500 e não 615 euros.

O fenómeno é transversal a toda a sociedade. E venha de lá o mais pintado dizer que nunca deixou de pagar tudo o que deveria. Houvesse vontade política de combater a fraude e através da carga fiscal proceder a uma redistribuição equitativa da riqueza nacional e outro galo cantaria.

terça-feira, julho 10, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 10 de Julho de 2012 – Não sei até onde recua a minha memória, mas creio recordar-me de factos de quando tinha três ou quatro anos de idade. Lembro-me, por exemplo, de estar todo o dia sentado junto de uma fogueira, enrolado num xaile de minha mãe, nos campos da Mata, enquanto os meus pais colhiam azeitona por conta de outrem.

Recordo-me de um certo dia, quando a minha mãe e outras mulheres “enfatulhavam” estacas – enfatulhar estacas consistia em enrolar palha molhada à volta de uma estaca que, se um dia viesse a singrar, seria uma estacazinha e posteriormente uma oliveira -, a tia Antónia Pereira me ter pedido um bocadinho de palha. Fui buscar palha à poça onde estava mergulhada em água, caí dentro da poça e só não morri afogado, porque a minha mãe estava sempre atenta. Passei essa manhã de primavera enrolado num avental de minha mãe à espera que a minha roupa enxugasse.

Durante o período da apanha da azeitona, acompanhava o meu pai e a minha mãe, a pé ou às cavalitas de meu pai, à chuva e ao vento, comendo pão com um bocadinho de conduto, que podia ser toucinho ou morcela, ovos fritos ou farinheira, uma talhada de queijo ou outra coisa qualquer, tudo com parcimónia, ainda que o pão, amassado e tendido por minha mãe, fosse sempre abundante. Lembro-me de uma vez, no couto do Firmino, mais concretamente na chamada Volta, ter caído a cesta de vime da nossa merenda e de eu ter gritado: “ai o nosso vinho!”. Durante muitos anos, os homens e as mulheres que assistiram à queda da cesta, lembraram-se com saudável gozo do grito “ai o nosso vinho!”.

Eu nem sei ao certo porque estou a escrever tudo isto, ainda que a vontade primeira fosse a de perguntar numa universidade qualquer, a quantas cadeiras teria direito, bolonhesas ou não bolonhesas, num curso de silvicultura ou de coisa parecida, se quisesse obter o referido grau académico. Mas há uma pergunta óbvia: “ para quê toda esta conversa da treta?”.

E por que carga de água se “enfatulhavam” as estacas? E concretamente o que eram as tais estacas?

sábado, julho 07, 2012

DO MEU DIÁRIO

Paços do Concelho
Santa Iria de Azóia, 7 de Julho de 2012 – As aulas do ciclo e do secundário começavam sempre no primeiro dia do mês de Outubro. E foi precisamente no dia um de Outubro de mil novecentos e sessenta e quatro que fui viver em Castelo Branco. Na acanhada Rua de Santa Maria, a pouco mais de cinquenta metros do antigo Albergue Municipal, onde era popular um homem com problemas mentais, de nome Raul, que cravava cigarros a toda a gente.

Eu não tenho a certeza se nesse ano desfilei no 1º de Dezembro, com a farda da Mocidade Portuguesa, da Praça Rainha D. Leonor até à Sé, onde era celebrada missa e abençoada esta criação do fascismo português. Eu gostava de ir e de assistir à missa, onde a páginas tantas, se ouviam poderosos clarins, que emprestavam um tom guerreiro à festa da Restauração. Ou pelo menos era assim que eu sentia as coisas.

Eu vinha da aldeia, a Mata, onde fui aluno de um professor que obrigava diariamente a pequenada a formar e a marchar e a cantar o “somos pequenos lusíadas”. Dizia-se que era informador da ex-PIDE, facto que nunca tive curiosidade em confirmar, apesar de com ele me ter incompatibilizado naquele ano decisivo de mil novecentos e sessenta e nove. Encontrou-me no armazém do Carlos Vale, na J. A. Morão, onde eu executava uma tarefa eleitoral, ajudando a CDE. O dito professor ia à procura do Cartório Notarial e depara-se com um ex-aluno a ajudar nas actividades da oposição democrática. Por puro voluntarismo, que as convicções mais profundas só vieram a seguir.

Não estranhei muito, portanto, aquele ambiente de 1º de Dezembro, agora com camisa verde, cinto com S, calções e bivaque castanhos. Não me recordo se os sapatos também faziam parte do fardamento. Eu respirava patriotismo e catolicismo por todos os poros. E admirava sinceramente aqueles comandantes de castelo e de bandeira, que, no meu entendimento de doze anos, eram verdadeiros generais. O Rosado e o Mário eram na EICCB, actual escola Amato Lusitano, dois grandes chefes.

sexta-feira, julho 06, 2012

DO MEU DIÁRIO

Praça Camões- Praça Velha 

Santa Iria de Azóia, 4 de Julho de 2012 – Castelo Branco, nos meus tempos de menino e moço (deixem lá passar o cliché), tinha quatro feiras anuais. Em Agosto (30), a chamada Feira Franca, que era, de longe, a mais importante de todas, trazia à cidade muitas centenas de pessoas, vindas de todo o concelho e até do distrito, incluindo muitos carteiristas. Em Outubro (4), Dezembro (18) e Janeiro (6), realizavam-se as restantes, que estavam longe de ter a participação popular e a importância da feira de Verão.

A parte mais visível das feiras era a das tendas na Devesa, onde se vendia de tudo um pouco, desde os trapinhos ao ouro, que as feiras de Castelo Branco tinham sempre muitos ourives a vender relógios e artefactos em ouro e prata. E como era feira franca, havia também a franqueza de regatear o preço de todos os produtos. Creio que este velho hábito de regatear ainda não desapareceu completamente, apesar das transformações que Portugal e a região de Castelo Branco sofreram nos últimos cinquenta anos.

Castelo Branco teve e continua a ter um mercado semanal – uma verdadeira feira -, onde as populações compram uma infinidade de utilidades. Na minha infância e adolescência, era no Largo da Devesa, depois passou para o Cansado e na actualidade é no Ribeiro de Perdizes. O terrado foi preparado para o efeito; tendo, por conseguinte, melhores condições. É sobretudo o espaço comercial dos populares e das gentes das aldeias, que encontram ali os produtos de que mais necessitam e aos melhores preços. Ou talvez não.

Eu teria quatro ou cinco anos, quando desapareceu a antiga Praça, que era no local onde na década de sessenta foi construído o Palácio de Justiça. Era uma construção em ferro, onde a minha mãe comprava bananas pequeninas e muito maduras mas doces como mel. Depois foi o tornado de cinquenta e quatro, ou coisa parecida, que levou a cobertura para as bandas do Monte de S. Luís, nos Escalos de Baixo (vox populi dixit), facto que terá apressado a construção da Praça da 28 de Maio, actual 1º de Maio, que foi durante muito tempo um ex-libris da cidade.

Como facilmente se depreende deste texto, Castelo Branco deu sempre muita importância às feiras e ao mercado. E a sua Praça, que sofreu obras há poucos anos, merece uma visita.



sexta-feira, junho 29, 2012


o antigo edifício dos correios
Santa Iria de Azóia, 29 de Junho de 2012 – Vistas bem as coisas, a democratização do ensino começa ainda nos anos sessenta. Por imposição do crescimento industrial e também graças à forte emigração verificada nas zonas do interior. Castelo Branco não fugiu à regra, tendo assistido à partida de muitos milhares de camponeses e trabalhadores da construção civil. Primeiro os homens e depois as mulheres. E os filhos, que ficavam entregues aos avós, podiam agora transpor o limiar da escola técnica. O liceu de Nun’ Alvares continuava destinado aos do costume e assim continuou até ao 25 de Abril.

Não era de ensino e de democratização de ensino que eu queria falar hoje, que não é tema que domine bem. Eu falo de coisas mais triviais, que os sociólogos e outros cientistas sociais ignoram. Hoje quero falar de matraquilhos, que eram muito populares na cidade, nos anos sessenta, com largas dezenas de mesas espalhadas por todo o perímetro urbano: na Rua dos Prazeres, a dois passos da Sé, era o “Tonho dos Bonecos”; numa quelha daquela mesma rua, por detrás do restaurante Lua e Sol - uma viela por onde passavam as meretrizes a caminho do Café Lusitânia - também se jogava este jogo barulhento; na Rua João de Deus, tinha porta aberta o Sr. Aníbal Barata, num espaço que antes tinha sido de comes e bebes; ao cimo da Rua de Santiago, com tasca contígua, existia outra casa de matrecos, a primeira onde exercitei a minha perícia de atacante; e, por último, refiro também o Maresia, na correnteza do Café Beirão, defronte do maior “prêt-à-porter”, o António dos Capotes.
antiga biblioteca municipal e também da Gulbenkian
Por toda a cidade havia inúmeras tascas que tinham a sua mesa de matraquilhos; porém, creio que as casas referidas no parágrafo anterior eram, indiscutivelmente, as mais populares. Os clientes eram os estudantes e os militares, ou seja, a população mais jovem da cidade. Castelo Branco possuía vários estabelecimentos de ensino e dois regimentos militares, um de cavalaria e outro de caçadores, que forneciam os clientes para estas saudáveis casas de diversão. A população da cidade renovava-se permanentemente com a chegada e partida de militares e estudantes.

Conheci grandes jogadores de matraquilhos. Destaco o malogrado Luís “Canetas”, com quem jogava na quelha de acesso ao Café Lusitânia, por onde passavam, dolentes e pesadonas, as meretrizes, que teimavam em andar sempre muito pintadas e de sapatos de salto alto. Outros tempos!

quinta-feira, junho 28, 2012

DO MEU DIÁRIO

Amato Lusitano
Santa Iria de Azóia, 28 de Junho de 2012 – Os jornais chegavam a Castelo Branco de comboio: os matutinos por volta do meio-dia e os vespertinos por volta das vinte horas, quando os comboios circulavam com pouco atraso, porque também acontecia os matutinos chegarem à tardinha e os vespertinos só serem lidos na manhã seguinte.

Se a memória não me atraiçoa, o quiosque Vidal detinha o monopólio dos pouco madrugadores DN e Mundo Desportivo e dos vespertinos Diário Popular e República; ti Albino – que espectáculo de ardina! – comercializava O Século, A Bola e o Record, matutinos, e o Diário de Lisboa e A Capital, vespertinos. E a famosa revista de actualidade: Vida Mundial, hebdomadária, com saída ao sábado.

Ti Albino - era assim tratado o mais desembaraçado dos ardinas albicastrenses -, vinha a correr da estação da CP com um molho de jornais debaixo do braço, até ao centro da cidade, gritando a plenos pulmões “é o Séeeeeeculo”, “é A Booooola”, “é o desastre”, “é o séeeeeeeeeculo”, “é o Record”, etc. Sempre em movimento e a apregoar, só parando para entregar o jornal ao cliente, receber e fazer trocos. Tinha na sua mulher, cujo nome já esqueci, uma colaboradora assídua e esforçada, que passava os dias a complementar a actividade do marido, ao frio e ao calor, naquele vão de escadas que dava acesso à parte de consultórios do edifício em cujo rés-do-chão funcionava o café Arcádia, que tinha a sala de bilhares ao lado.

Os outros ardinas eram Zé Gavetas e Zé Noco. O primeiro, era um homem muito querido na cidade, porque era simpático e, por vezes, até muito reverente; Zé Noco - irmão de ti Albino - que nunca tirava o cigarro dos beiços, era uma figura esquálida e nada sociável. A rapaziada metia-se com ele, porque sabia que havia de ouvir um chorrilho de asneiras ou ver algum daqueles gestos menos recomendáveis.

E aqui deixo um retrato dos ardinas da cidade, seguramente incompleto e impressivo; no entanto, creio que não terei cometido imprecisões de monta. É que o tempo passa e a minha memória já não é o que era.

quarta-feira, junho 27, 2012

DO MEU DIÁRIO

entrada norte de Castelo Branco

Santa Iria de Azóia, 27 de Junho de 2012 - O quiosque Vidal, era, nos anos sessenta e setenta do século passado – até ao 25 de Abril -, o “sítio” onde se podiam adquirir as principais revistas do país e também alguma da melhor literatura que se ia fazendo em Portugal.

Não admira, assim, que o quiosque Vidal fosse o local de encontro de quem lia e de quem procurava aquela documentação oposicionista que a bondade do regime do guarda-livros do Vimieiro, e depois do “conversas em família”, ia deixando circular. O senhor Vidal era um homem bastante alto e muito teatral, que, creio, também tinha um negócio de padarias. E o seu empregado, o Zé Fernandes, era não só um grande leitor de lombadas; mas, também, um leitor atento de alguns dos melhores autores romanescos, portugueses e estrangeiros.

Eu soube há dias que o Zé Fernandes, que morava, quando o conheci, numa daquelas casinhas pequeninas do bairro da Horta de Alva, já fez a última viagem. Fomos amigos muitos anos, e apesar das diferentes opiniões que tínhamos acerca da vida e do mundo, nunca deixámos de nos tratar com estima e cordialidade. Partilhámos o vinho e o pão vezes sem conta. E ainda me lembro de ter comido rabanadas na casa dos pais do Zé Fernandes, gente do Porto, numa noite em que cantávamos as Janeiras nas ruas de Castelo Branco.

Eu tinha decidido falar de jornais e ardinas e acabei a falar do quiosque Vidal e do Zé Fernandes. Fica provado que, na verdade, as conversas são como as cerejas. É que nem de propósito: estamos no tempo delas.

segunda-feira, junho 25, 2012

DO MEU DIÁRIO


Fotografia retirada do "sítio" da CMCB

Santa Iria de Azoia, 25 de Junho de 2012 - Em 21 de Julho, far-se-á a apresentação de QUADRAS POPULARES – UMAS SIM, OUTRAS QUASE, no Cine-Teatro Avenida, na cidade de Castelo Branco.

Vou regressar ao velho edifício do cinema após uma ausência de décadas. Vou regressar ao velho edifício do cinema, porque não dizê-lo, com alguma comoção e expectativa. Vou regressar ao velho edifício do cinema do qual guardo memória de inúmeros filmes, de outros espectáculos inesquecíveis, de bailes, etc. Vou ao encontro dos meus conterrâneos com um livro de quadras, que é o que tenho, de momento, para lhes oferecer.

Na década de sessenta do século passado, o Cine-Teatro Avenida era um edifício polivalente, embora o cinema fosse a sua principal actividade. Comparável ao Monumental e ao Império, que eram duas grandes e excelentes salas de espectáculos da capital. Tinha duas plateias, um primeiro balcão enorme e, ao cimo deste, um espaço de camarotes. Tinha ainda um segundo balcão com entrada própria, que era conhecido pelo piolho. O senhor Fernando controlava a entrada principal e tratava da sala; o Guilhermino, uma figura castiça da cidade, colocava os cartazes nos sítios do costume e distribuía a restante publicidade.

Sei que o Cine-Teatro Avenida esteve vários anos fechado. Sofreu obras de remodelação e tem agora uma vida diferente. As notícias vão-me chegando, amiúde, através de Cultura Vibra. Ainda que a traça inicial se tenha mantido quase intocável, exteriormente, sei que foram feitas importantes obras no interior. Não sei o que restará da velha sala polivalente, mas mais ao cinema dada, e por isso vou com muita curiosidade.

Vou com um livro de quadras na mão.

sábado, junho 23, 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 23 de Junho de 2012 – António Salvado – poeta, ensaísta, antologiador e museólogo -, é um nome incontornável da vida cultural de Castelo Branco, a sua terra natal, e de toda a Beira Baixa.

Ontem, um amigo comum, o poeta José Antunes Ribeiro, brindou-me com dois Salvado (deixem lá a metonímia) de peso, a antologia de AUTORES NASCIDOS NO DISTRITO DE CASTELO BRANCO (Século XV a 1908) e Na eira da Beira (edição comemorativa do cinquentenário da vida literária de António Salvado), que já folheei e que hei-de ler, proximamente, com a devida atenção.

A generosidade do José Antunes Ribeiro é, portanto, a responsável por estas linhas e pelo belíssimo poema que aqui transcrevo de NA eira da Beira:

Albicast(r)o




Onde as pedras desenham a encosta


e as oliveiras testemunham a paz.



Uma linha de luz que freme e rola


na solidão do longe ao lado larga.






As fréseas da infância no sol-posto


como poema anterior à escrita,






e entre graranito o amanhecer: o sopro


calmo das velhas ruas          velhos sítios.






Amuralhada no seu estar dormida


de branco lenço ao peito a castelar -


uns olhos ficam tristes por partir,


uns olhos partem tristes por ficar.




Nota: ambas as obras têm a chancela de Arion Publicações, Lda.

sexta-feira, junho 22, 2012

DO MEU DIÁRIO


regresso às hortas

Santa Iria de Azóia, 22 de Junho de 2012 – Vítor Gaspar, o todo-poderoso governador incumbido das finanças do reino, vem agora a admitir, após ter posto o país a pão e água, que será muito difícil cumprir as metas do défice. Ainda antes de meio ano orçamental cumprido, preparem-se para o que aí vem.

A queda das receitas fiscais era óbvia. Não era preciso ir a Delfos para prever a queda acentuada das receitas fiscais. Até o Pe. Fontes, homem que muito prezo e admiro, não deixaria de prever a queda das receitas fiscais. Apenas Vítor Gaspar, e também o seu chefe imediato, e também os restantes membros da equipa de governadores, terá acreditado na bondade daquela austeridade imposta pelos imbecis da troika e pelo senhor Schauble, sem trema, um dos mentores deste desgraçado castigo imposto aos povos do sul da Europa.

e à criação de galinhas

Gaspar - mas antes de Gaspar Coelho e Portas -, tem que ser responsabilizado pela implementação de medidas restritivas do consumo e pelo empobrecimento dos portugueses. Têm que ser responsabilizados pelo clima de terror que criaram na sociedade portuguesa, com as nefastas consequências que estão à vista: desemprego, degradação das condições de vida dos trabalhadores, retracção do consumo, degradação dos serviços públicos, queda das receitas fiscais, etc., etc., etc. E ainda pelas gravosas medidas futuras que a confissão de hoje já prenuncia.

quarta-feira, junho 20, 2012

DO MEU DIÁRIO


David Mourão-Ferreira, um grande poeta

Santa Iria de Azóia, 20 de Junho de 2012 – La Chartreuse de Parme de Stendhal é, indiscutivelmente, um dos melhores romances franceses de todos os tempos. E o mesmo se poderá dizer de Le Rouge et le Noir do mesmo autor. A Chartreuse li-a com a ajuda de um tal David Mourão- Ferreira, que era um grande apaixonado pela literatura francesa e pela Itália. Le Rouge et le Noir só o li mais tarde, mas seguindo a lição do autor de A Secreta Viagem. Não sei se Vino Rossi, um romance que David trouxe em mente, chegou a ser escrito e editado.

Hoje deu-me para dizer meia dúzia de coisas acerca de David Morão-Ferreira, que era um homem de trato muito fino e um grande sedutor. Não admira, pois, que tivesse sempre uma pequena corte de jovens mulheres por perto. Tinha uma caligrafia bem legível e era um adepto incondicional das esferográficas BIC. Vestia muito em tons de castanho, como se tudo tivesse de condizer com o seu inseparável cachimbo.

Nos anos oitenta usou um daqueles sobretudos que Freitas do Amaral celebrizou quando foi candidato à Presidência da República. E também um boné, que o protegia do frio. Entrava na FL, subia ao piso superior e dirigia-se para uma das salas do departamento de românicas, onde dava aulas ao fim da tarde e/ou princípio da noite. Nunca prescindia de entrar nos sanitários para dar um jeito ao cabelo. Fazia gala em cultivar um primoroso aprumo, que lhe conferia um toque de classe.

E este homem de vasto saber, que lia poetas portugueses e europeus como ninguém, por vezes gaguejava. Sobretudo quando se enervava com a ignorância, que, já naquele tempo, era muita na casa das humanidades. Gaguejava, por exemplo, quando alguém – e isto vale só como exemplo – lhe dizia que Montaigne era um filósofo do séc. XIX ou que François Villon era um poeta do séc. XVIII. E no entanto, David nunca desautorizava um aluno. Tentava sempre, a partir de uma resposta errada ou menos rigorosa, conduzir o aluno à resposta que ele considerava a mais acertada.

E Stendhal foi apenas o pretexto para aqui deixar meia dúzia de palavras acerca de um daqueles portugueses, que, tendo sido governante, nos deixou uma obra notável como poeta e ensaísta. Bem ao contrário dos Mira deste mundo.