sábado, maio 31, 2008

GOSTA O POVO DESTA MALTA

Gosta o povo desta malta
De falajar fluido e forte;
Faz vénias aos da alta,
Aos do Sul e aos do Norte.

Vive sempre acocorado
Face à gajada do mando.
Fica em casa acagaçado,
Só reage de vez em quando.

Aceita o roubo e a pobreza
Como coisa natural.
E consente que a esperteza
Vá mandando em Portugal.

Venera beatos e santos
Aos quais roga protecção.
Adora rezas e prantos
E andar de chapéu na mão.

Um dia há-de acordar.
Precisa de um abanão
E aposto que há-de lutar
E à canalha dizer não.

Se lavas ou não no rio,
É coisa de pouca monta.
Quero-te cheio de brio,
Força, coragem e ponta!

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 30 de Maio de 2008 – Confesso que aprecio a prosa de Fernanda Câncio, que leio às sextas-feiras no “DN”. Porém, nem sempre concordo com as ideias defendidas. Foi o caso da crónica (?) de hoje, que vinha repleta de números para tentar explicar o inexplicável. A prosa de hoje, em boa verdade, não tinha a qualidade do costume.

Eu creio que Fernanda Cância terá algum mundo. Profissional da comunicação, deve conhecer, certamente, a generalidade dos países da EU. E nomeadamente a Espanha, a França e a Bélgica. E a questão do conhecer ou não conhecer é relevante para decidirmos acerca da pobreza. É que da leitura da crónica (?), fiquei com a sensação de que a fome grassa por essa Europa fora e que a situação em Portugal, mais pontinho percentual menos pontinho percentual, é semelhante à da Espanha e da França e melhor do que a da Bélgica.

Ainda que toda a realidade europeia me desagrade, mais a do centro e do sul, gostava de acreditar que os números de Fernanda Câncio espelham a realidade. Sei que a França atravessa um mau bocado; sei que a Bélgica não será o melhor dos reinos; sei até que o crescimento económico abrandou em Espanha. E porque sei e porque não acredito nos números, para mim a crónica (?) de Fernanda Câncio podia ter ser escrita por um qualquer Manuel Pinho ou por um qualquer Vieira da Silva se, acossados, se quisessem defender da acusação de maus desempenhos governativos.

O real, por vezes, não está na crueza dos números e para o apreender basta olhar com atenção e ser perguntador. Como Fernanda Câncio fez no seu penúltimo texto, no “DN”. E já agora: há alguma razão para acreditar que os números de 2005, 2006, 2007 e 2008, concernentes à pobreza em Portugal, são melhores do que os de 2004?


quinta-feira, maio 29, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 29 de Maio de 2008 – Algumas personalidades começam a ficar nervosas com a pobreza em Portugal. Até parece que estamos perante um problema novo e que anteriormente vivíamos no melhor dos mundos. Soares tocou a trombeta no “DN”. Alegre, bloquistas e dissidentes, vão reunir-se em comício para falar da crise social, em geral, e da pobreza, em particular. É o coro das virgens.

Neste Diário, que hoje grafo com maiúscula, tenho abordado amiúde os flagelos da nossa sociedade, com a promessa de bengaladas futuras no traseiro de alguns dos liberais que fazem opinião em Portugal. A crise dos combustíveis só pôs a nu, quão engravatada tem sido a nossa miséria. E o escândalo radica, fundamentalmente, no facto de sermos o país onde o tradicional fosso que separa os ricos dos pobres se ter transformado num abismo. Aquilo que se ia sussurrando é agora assumido por vastos sectores da sociedade, sendo indecorosa a posição do grupo parlamentar do PS e do seu chefe, o sempre enfático e enfatuado Alberto Martins, que suportam o insuportável governo Sócrates.

Neste momento já não há lugar para manobras de diversão. A realidade é o que é e a coisa já não vai lá com almofadinhas. Os pobres estão cada vez mais pobres, passe o cliché, e a classe média foi completamente esborrachada por esta governação. Afinal de contas, feitos os sacrifícios, encontramo-nos em piores lençóis do que antes desses mesmos sacrifícios.

Portugal merecia, Portugal merece mais e melhor!

quarta-feira, maio 28, 2008

RAFAEL ALBERTÍ

NANA DE LA CIGÜEÑA

Que no me digan a mí
que el canto de la cigüeña
no es bueno para dormir.

Si la cigüeña canta
arriba en el campanario
que no me digan a mí
que no es del cielo su canto



in Marinero en tierra, Alianza Editorial (Biblioteca Albertí)

domingo, maio 25, 2008

JACQUES PRÉVERT

BARBARA
Rappelle-toi Barbara
Il pleuvait sans cesse sur Brest ce jour-là
Et tu marchais souriante
Épanouie ravie ruisselante
Sous la pluie
Rappelle-toi Barbara
Il pleuvait sans cesse sur Brest
Et je t’ai croisée rue de Siam
Tu souriais
Et moi je souriais de même
Rappelle-toi Barbara
Toi que je ne connaissais pas
Toi qui ne me connaissais pas
Rappelle-toi
Rappelle-toi quand même c jour-là
N’oublie pas
Un homme sous un porche s’abritait
Et il a crié ton nom
Barbara
Et tu as couru vers lui sous la pluie
Ruisselante ravie épanouie
Et tu t’es jetée dans ses bras
Rappelle-toi cela Barbara
Et ne m’en veux pas si je te tutoie
Je dis tu à tous ceux que j’aime
Même si je ne les ai vus qu’une seule fois
Je dis tu à tous ceux qui s’aime
Même si je ne les connais pas
Rappelle-toi Barbara
N’oublie pas
Cette pluie sage et heureuse
Sur ton visage heureux
Sur cette ville heureuse
Cette pluie sur la mer
Sur l’arsenal
Sur le bateau d’Ouessant
Oh Barbara
Quelle connerie la guerre
Qu’es-ce-tu devenue maintenant
Sous cette pluie de fer
De feu d’acier de sang
Et celui qui te serrait dans ses bras
Amoureusement
Est-il mort disparu ou bien encore vivant
Oh Barbara
Il pleut sans cesse sur Brest
Comme il pleuvait avant
Mais ce n’est plus pareil et tout est abîmé
C’est une pluie de deuil terrible et désolée
Ce n’est même plus l’orage
De fer d’acier de sang
Tout simplement des nuages
Qui crèvent comme des chiens
Des chiens qui disparaissent
Au fil de l’eau sur Brest
Et vont pourrir au loin
Au loin très loin de Brest
Dont il ne reste rien.

BARBARA
Tradução de Manuel Barata

À Lídia Martinez

Lembra-te Barbara
Chovia sem parar sobre Brest naquele dia
E tu caminhavas sorridente
Alegre feliz resplandecente
Sob a chuva
Lembra-te Barbara
Chovia sem parar sobre Brest
E cruzei-me contigo na rua de Siam
Tu sorrias
E eu sorria também
Lembra-te Barbara
Tu que eu não conhecia
Tu que me não conhecias
Lembra-te
Lembra-te portanto daquele dia
Não esqueças
Um homem sob um pórtico abrigado
Gritou o teu nome
Barbara
E tu correste para ele sob a chuva
Resplandecente feliz alegre
E lançaste-te nos seus braços
Lembra-te disso Barbara
E não me queiras mal por te tratar por tu
Trato por tu todos os que amo
Ainda que os tenha visto uma só vez
Trato por tu todos os que se amam
Ainda que os não conheça
Lembra-te Barbara
Não esqueças
Esta chuva sábia e feliz
Sobre o teu rosto feliz
Sobre esta cidade feliz
Esta chuva sobre o mar
Sobre o arsenal
Sobre o barco de Ouessant
Oh Barbara
Que parvoíce a guerra
Quem és tu agora
Sob esta chuva de ferro
De fogo de aço de sangue
E aquele que te apertava nos braços
Amorosamente
Morreu desapareceu ou é ainda vivo
Oh Barbara
Chove sem parar sobre Brest
Como chovia antes
Mas nada é igual e está tudo destruído
É uma chuva de luto terrível e desolada
Não é a mesma tempestade
De ferro de aço de sangue
Simplesmente nuvens
Que rebentam como cães
Cães que desaparecem
Na torrente da água que cai sobre Brest
E vão apodrecer longe
Longe muito longe de Brest
Da qual nada resta

sábado, maio 24, 2008

FEDERICO GARCÍA LORCA

ENCUENTRO

María del Reposo,
te vuelvo a encontrar
junto a la fuentefría
del limonar.
i Viva la rosa en su rosal!

María del Reposo,
te vuelvo a encontrar,
los cabellos de niebla
y ojos de cristal.
i Viva la rosa en su rosal!

María del Reposo
te vuelvo a encontrar.
Aquel guante de luna que olvidé,
donde está?
i Viva la rosa en su rosal!

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 24 de Maio de 2008A selecção nacional está em Viseu, onde já chegara antes, muito antes, o poeta Daniel Abrunheiro. Não consta que tenha chegado de Bentley ou de Porshe e que tenha mirones e mais mirones atrás de si. Por norma, os poetas são discretos, porque a poesia não é desporto de massas. Exige um aparato teórico e técnico que talvez Jorge Valdano domine, mas que não está ao alcance das estrelas que brilham por estes dias, na cidade de Viriato.

Esta também não é a minha selecção. Selecção sem coluna, não é selecção. Mário Esteves Coluna, para quem não saiba, é o nome do grande capitão da selecção e do Benfica, dos idos de sessenta, que soube honrar a camisola das quinas e a da águia, sem nunca descurar as coisas verdadeiramente importantes, que o haviam de catapultar para cargos desportivos de tomo no seu Moçambique independente.

Assente a poeira, e liberta a cidade onde Simão Botelho se apaixonou fatalmente por Teresa Albuquerque, o poeta Daniel Abrunheiro por lá continuará a trabalhar, não gastando da fazenda da Pátria, mas enriquecendo-a com a abundância e qualidade dos seus versos. E também das suas crónicas, que saboreei durante a última madrugada.


A minha selecção não é a desse brasileiro astuto, que, como outros, trata muito bem da vidinha, seja a aconselhar a colocar bandeiras às janelas, seja a indicar-nos o nome do banco da sua preferência. Por mim, bem pode pedir à virgem de Caravaggio, porque eu, tal como os peixes, nunca me hei-de converter. Juro, Mestre Vieira!

sexta-feira, maio 23, 2008

DO MEU DIÁRIO

Barreira da Fonte - A entrada da Aldeia
Lisboa, 23 de Maio de 2008 – Discute-se muito, nos dias que correm, o aumento do preço dos combustíveis. A discussão é pertinente e afecta o cantinho lusitano na sua totalidade. É que o preço dos combustíveis, de uma forma ou outra, há-de reflectir-se num qualquer aspecto da minha e da vida dos meus concidadãos.

Durante a minha infância, só conheci verdadeiramente um meio de transporte: a carroça, puxada a mula ou a macho, que nos levava de manhã até Castelo Branco e nos trazia à tarde de regresso à Mata. Foram tempos indiscutivelmente difíceis para as pessoas e os animais. Quando alguém adoecia, se a coisa não era logo muito grave, esperava-se até à segunda-feira, para consultar o clínico e tratar das maleitas.

Na Mata havia quatro ou cinco veículos automóveis, na década de cinquenta: Francisco e José Melo, o professor Falcão, Joaquim Capinha e Manuel Beato, eram os únicos que possuíam carro e usavam-no com muita parcimónia. Lembro-me de ajudar a empurrar, conjuntamente com outros alunos da escola da Mata, o automóvel do professor Falcão, que, por falta de uso, tinha a bateria quase sempre descarregada. Porém, com todos os defeitos que tinha, e eram muitos, dava boleia às pessoas nas horas de aflição. Talvez por isso e por ter sido um professor residente, muito autoritário e em perfeita sintonia com o poder instituído antes de Abril, a autarquia concedeu-lhe o nome de uma rua.

E tudo isto vem a propósito dos sucessivos aumentos dos combustíveis, que, a crescerem a este ritmo, vão desencadear ondas de desassossego social de efeitos imprevisíveis. E justíssimas, até pelo facto de Portugal ser o país da EU onde os ricos são cada vez mais ricos e onde aumenta diariamente o número dos pobres e miseráveis. Apesar do mundo, com todos os seus novos e velhos problemas, ser hoje infinitamente melhor do que o mundo da minha infância.

terça-feira, maio 20, 2008

FREDERICO GARCÍA LORCA

CANCIÓN DEL DÍA QU SE VA


¡ Qué trabajo me cuesta
dejarte marchar, día!
Te vas lleno de mí
vuelves sin conocerme.

i Qué trabajo me cuesta
dejar sobre tu pecho
posibles realidades
de imposibles minutos!

En la tarde, un Perseo
te lima las cadenas,
Y huyes sobre los montes
hiriéndote los pies.
No pueden seducirte
mi carne ni mi llanto,
ni los rios en donde
duermes tu siesta de oro.


Desde Oriente a Occidente
llevo luz redonda.
Tu gran luz que sostiene
mi alma, en tensión aguda.
Desde Oriente a Occidente,
i qué trabaljo me cuesta
llevarte com tus pájaros
y tus brazos de viento!



(Aí vai, voando, na língua original,
Amigo João Teixeira, esta bela canção
de Frederico)

domingo, maio 18, 2008

JACQUES PRÉVERT

POUR TOI MON AMOUR


Je suis allé au marché aux oiseaux
Et j’ai achete des oiseaux
Pour toi
mon amour
Je suis allé au marché aux fleurs
Et j’ai achete des fleurs
Pour toi
mon amour
Je suis allé au marché à la ferraille
Et j’ai achete des chaînes
Pour toi
mon amour
Et puis je suis allé au marché aux esclaves
Et je t’ai cherchée
Mais je ne t’ai pas trouvée
mon amour
in PAROLES, folio PLUS, 1997



PARA TI MEU AMOR

Fui ao mercado dos passarinhos
E comprei passarinhos
Para ti
Meu amor
Fui ao mercado das flores
E comprei flores
Para ti
meu amor
Fui ao mercado das ferragens
E comprei correntes
Para ti
meu amor
E depois fui ao mercado dos escravos
E procurei-te
Mas não te encontrei
meu amor
Tradução de Manuel Barata

sábado, maio 17, 2008

GRANDES POETAS

DÉJEUNER DU MATIN
Jacques Prévert

Il a mis le café
Dans la tasse
Il à mis le lait
Dans la tasse de café
Il a mis le sucre
Dans le café au lait
Avec la petite cuiller
Il a touné
Il a bu le café au lait
Et il a reposé la tasse
Sans me parler
Il a allumé
Une cigarette
Il a fait des ronds
Avec la fumée
IL a mis les cendres
Dans le cendrier
Sans me parler
Sans me regarder
IL s’est levé
IL a mis
Son chapeau sur sa tête
Il a mis
Son manteau de pluie
Parce qu’il pleuvait
Et il a parti
Sous la pluie
Sans une parole
Sans me regarder
Et moi j’ai pris
Ma tête dans ma main
Et j’ai pleuré.

In Paroles, Folio Plus, 1997



PEQUENO-ALMOÇO

Pôs o café
Na chávena
Pôs o leite
Na chávena de café
Pôs o açúcar
No café com leite
Com a colherzinha
Mexeu
Bebeu o café com leite
E poisou a chávena
Sem me falar
Acendeu
Um cigarro
Fez bolinhas
Com o fumo
Pôs a cinza
No cinzeiro
Sem me falar
Sem me olhar
Levantou-se
Vestiu a gabardina
Porque chovia
E partiu
Debaixo de água
Sem uma palavra
Sem me olhar
E eu
Com a cabeça entre as mãos
pus-me a chorar.


Tradução de Manuel Barata

quinta-feira, maio 15, 2008

GRANDES POETAS

LE DISCOURS SUR LA PAIX

Vers la fin d'un discours extrêmement important
le grand homme d'État trébuchant
sur une belle phrase creuse
tombe dedans
et désemparé la bouche grande ouverte
haletant
montre les dents
et la carie dentaire de ses pacifiques raisonements
met à vif le nerf de la guerre
la délicate question d'argent.

Prévert, Jacques, Paroles, folioPLUS, 1997

DISCURSO SOBRE A PAZ
Tradução de Manuel Barata

Perto do final de um discurso extremamente importante
o grande homem de Estado tropeça
numa bela frase vazia
cai dentro dela
e desamparado com a bocarra aberta
ofegante
mostra os dentes
e a cárie dentária dos seus pacíficos raciocínios
põe a nu o nervo da guerra
a delicada questão de/o/ dinheiro.

quarta-feira, maio 14, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 14 de Maio de 2008 – Angola, a jóia do antigo império colonial, é uma pedra que persevera em não sair dos sapatos de portugueses e angolanos. Todos os anos pela Primavera (Stau Monteiro não se importa), ou mais coisa menos coisa, de um lado e de outro, renasce um conflito. E quase sempre com a família Soares na ribalta. Já era tempo de se perdoarem uns aos outros.

Durante muitos anos – e por razões óbvias –, defendi, de um modo geral, as posições do MPLA. Nunca fui um incondicional de coisa nenhuma, mas acreditava que o MPLA era o movimento de libertação – e mais tarde o partido político –, que melhor defendia os interesses do povo angolano. A guerra e as ajudas externas da UNITA confortavam a minha posição; porém, com o fim da guerra e as novas opções políticas do MPLA e do seu governo, fui-me afastando das minhas posições primitivas e hoje comungo da ideia de que Angola é governada por uma cambada sem vergonha.

Angola, evidentemente, não é uma democracia. E nomeadamente, uma democracia formal, ou seja, com eleições livres e justas, liberdade de expressão, etc. No fundo, uma democracia do agrado dos EUA, da União Europeia e de Israel, que são as entidades que passam os certificados de bom comportamento democrático aos restantes povos do mundo.

No meio desta hipocrisia toda, bastaria que outro tratante ocupasse o lugar do tratante Eduardo dos Santos e que outros tratantes ocupassem os lugares ocupados pelos actuais tratantes do MPLA, para que os indignados de hoje se tornassem nos conformados de amanhã. As boas consciências contentam-se com os rituais eleitorais periódicos e estão-se nas tintas para o bem-estar dos povos. É assim o humano jogo das paixões.

O problema de Angola é a sua enorme riqueza. E com esta ordem mundial, os angolanos continuarão a ser as grandes vítimas. Dos ladrões de serviço no seu governo e demais instituições; dos cleptómanos instalados noutros sítios do mundo e cujos interesses têm defesa nas mais diversas chancelarias. Estas, está claro, representativas das mais genuínas democracias.

domingo, maio 11, 2008

DO MEU DIÁRIO


Lisboa, 10 de Maio de 2008 – No final dos anos sessenta, Castelo Branco era uma cidade interessante: vários estabelecimentos de ensino públicos e privados, dois jornais regionalistas (“Beira Baixa” e “Reconquista”), diversas colectividades de cultura e recreio e “duas fabriquetas / Onde a matar se aprendia”. A “Semedo” era indiscutivelmente a melhor livraria da cidade.

A estudantada reproduzia um pouco os hábitos da vida académica coimbrã. Alguns alunos dos 2º e 3º ciclos do liceu Nuno Alvares usavam capa e batina – oh, até o Joaquim Cordas! -, faziam serenatas e enterravam os cafés onde os estudantes eram maltratados. Lembro-me bem de uma bastonada apanhada no enterro do café “Acácio” me ter doído vários dias. A rapaziada da ISA acompanhava a do liceu. Os alunos do ensino técnico eram os parentes pobres da fauna estudantil da cidade. A sociedade albicastrense, tal como a sociedade nacional, encontrava-se bem estratificada.

Havia meia dúzia de figuras castiças – hoje dir-se-ia cromos –, que animavam a cidade. Zé Gavetas, que vendia o “DN” e o “Mundo “Desportivo”, por conta do quiosque Vidal, era um homem humílimo e exibia o bigode mais farfalhudo e original da cidade; ti Albino dos jornais, que vendia o “Século”, “A Bola” e o “Record” e cujos pregões eram inconfundíveis, foi o ardina mais completo que conheci em Portugal. Sempre em passo de corrida, ti Albino percorria as principais ruas do centro da cidade, gritando é o “Sééééculo!”, é o “Récord”, é “A Bóóóla!”. Zé Noco, empregado de ti Albino, era o paradigma da má criação. A obscenidade em pessoa. O Guilhermino, que era um pobre diabo, afixava e distribuía a publicidade do Cine Teatro Avenida e manifestava quotidianamente o seu benfiquismo. Lembro-me de o ver a contornar o rectângulo do Estádio Municipal, nos dias dos jogos do Benfica de Castelo Branco, erguendo um estandarte que, dizia-se, o tinha acompanhado a Amesterdão. Verdade ou mentira. O Guilhermino era uma verdadeira lenda. Um dia destes hei-de aqui falar do Tó Pina, que, obviamente, era uma personagem da cidade, mas que não tem nada em comum com as anteriores.

Outros tempos. Tomava-se a bica nos cafés e convivia-se; porém, o bem-estar actual e a liberdade, valem muito mais do que essas formas de convivência e do que o pitoresco que certas personagens conferiam à cidade.

sexta-feira, maio 09, 2008

DESENCONTROS

Sempre desejei
Um coração
De camponesa
Para gémeo do meu.

Só assim,
Pensava eu,
Poderia sentir,
Plenamente,
O alor
E o respirar
Da terra.

Outra coisa;
Porém, ditou
O poderoso destino.
E por isso
Vivo
O desatino
Dos desencontros.

Até um dia…
Ou talvez
Para sempre!



quarta-feira, maio 07, 2008


Lisboa, 7 de Maio de 2008No Maio de 68, estava à espera de fazer dezasseis anos e vivia, feliz e sem grandes sobressaltos, no nº 21 da Rua de Santo António, na pacata cidade de Castelo Branco. Frequentava o curso Geral do Comércio, jogava à bola em vários sítios com a maralha da escola e matraquilhos, na quelha das traseiras do café Lusitânia, que naquela época era frequentado pelas putas da cidade. E bilhar também, nessa grande escola que era o salão de jogos do Arcádia.

Meu pai, que já fizera a sua estreia como emigrante, em França, regressara a Portugal; porém, no princípio do ano seguinte havia de voltar de novo àquele país, onde permaneceu até ao Verão de 73. Minha mãe, que nunca temeu o trabalho, tinha vários hóspedes ao seu cuidado e ainda fazia umas horitas, aqui e ali, para aconchegar o orçamento familiar. Eu já frequentava a JOC, onde conheci excelentes padres e aprendi a jogar ténis de mesa.

Os relatos do Maio de 68, que ouvia na rádio, enchiam-me de alegria. Mas esta alegria radicava mais numa genuína vontade de ver o mundo de pantanas do que numa consciência política, que, efectivamente, não tinha. Ouvia as notícias com o mesmo entusiasmo com que lia os libérrimos livros do Vilhena, que a brigada “Patilhas-Ventoínhas” apreendia no Vidal, onde trabalhava o meu amigo Zé Fernandes.

O ano seguinte, esse sim, havia de ser determinante na minha vida, como determinante foi para milhares e milhares de portugueses. As eleições de 69 para a Assembleia Nacional, e a consequente mobilização levada a cabo pela CDE, deram um novo e decisivo rumo à minha vida.

Porém, como cantou a Piaff, “Je ne regrette rien!”.

terça-feira, maio 06, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 5 de Maio de 2008 – Ainda ontem escrevi que não me importava nada que o barco PP-PSD naufragasse, mas já sem tripulantes a bordo, obviamente. Como sei que se vai aguentar à tona de água, por enquanto, tenho para comigo que o melhor candidato é o jovem Passos Coelho.

Passos Coelho tem aparecido na SIC-Notícias, num programa informativo chamado “Frente-a-Frente”, e tem-se saído bem. Não exibe arrogâncias tolas e parece conviver bem com os adversários. Não possui a verve de Miguel Relvas, nem a pose pseudo aristocrática de Ângelo Correia, nem o calculismo do insular Guilherme Silva. Parece-me, assim, uma pessoa perfeitamente normal e capaz de levar a água ao seu moinho. O único senão é ser afilhado de Ângelo Correia, um pseudo bizantino da política e grande especialista de tudo e de coisa nenhuma.

De Santana Lopes está tudo dito. Apesar de alguns pressurosos fazedores de opinião e jornaleiros dos jornais lhe augurarem ainda um bom futuro, eu que fui a Delfos, vim de lá com a certeza de que o PPD-PSD o vai colocar onde ele merece estar, ou seja, no antepenúltimo lugar, porque a pessoa em questão, se não fosse tão esdrúxula, já teria deixado de andar por aí, para se refugiar na Figueira da Foz, onde terá feito uma obra excelentíssima.

Queria finalizar com uma espécie de máxima: todos aqueles que por atitudes narcisistas prejudiquem a república, deverão ressarci-la dos prejuízos que lhe causarem. Tenho dito!

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 5 de Maio de 2008 – Ainda ontem escrevi que não me importava nada que o barco PP-PSD naufragasse, mas já sem tripulantes a bordo, obviamente. Como sei que se vai aguentar à tona de água, por enquanto, tenho para comigo que o melhor candidato é o jovem Passos Coelho.

Passos Coelho tem aparecido na SIC-Notícias, num programa informativo chamado “Frente-a-Frente”, e tem-se saído bem. Não exibe arrogâncias tolas e parece conviver bem com os adversários. Não possui a verve de Miguel Relvas, nem a pose pseudo aristocrática de Ângelo Correia, nem o calculismo do insular Guilherme Silva. Parece-me, assim, uma pessoa perfeitamente normal e capaz de levar a água ao seu moinho. O único senão é ser afilhado de Ângelo Correia, um pseudo bizantino da política e grande especialista de tudo e de coisa nenhuma.

De Santana Lopes está tudo dito. Apesar de alguns pressurosos fazedores de opinião e jornaleiros dos jornais lhe augurarem ainda um bom futuro, eu que fui a Delfos, vim de lá com a certeza de que o PPD-PSD o vai colocar onde ele merece estar, ou seja, no antepenúltimo lugar, porque a pessoa em questão, se não fosse tão esdrúxula, já teria deixado de andar por aí, para se refugiar na Figueira da Foz, onde terá feito uma obra excelentíssima.

Queria finalizar com uma espécie de máxima: todos aqueles que por atitudes narcisistas prejudiquem a república, deverão ressarci-la dos prejuízos que lhe causarem. Tenho dito!

domingo, maio 04, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 4 de Maio de 2008 – Costuma dizer o povo que a idade tudo traz. Por isso mesmo, espero que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite ressurja com novas e melhores qualidades, para comandar o navio PPD/PSD que tem andado por aí à beira de um naufrágio.

Eu não ficava nada triste se o dito barco naufragasse ou que viesse a naufragar, porque é um barco demasiado caro e é um peso enorme nas contas da marinha. Ficava era com pena daqueles rapazes que teriam de correr a fundar outra coisa ou a inscrever-se noutra coisa mais à direita ou mais à esquerda, o que até não seria mau de todo, porque ajudava a clarear as coisas.

Lembro-me da Dr.ª Ferreira Leite ministra da Educação e também das Finanças, mas não retive nenhuma medida positiva que tenha a marca da sua lavoura. O que sei de fonte segura é que a senhora, que serviu como adjuvante do Dr. Cavaco e também do dr. Barroso (?), ajudou a denegrir de tal forma o funcionalismo público, que nunca mais houve normalidade na Administração. O tal “monstro”, no douto entendimento do Dr. Cavaco, mas que ele fez crescer e engordar durante dez anos, quando a Dr.ª Leite também teve responsabilidades enquanto adjuvante do agora chefe de Estado.

Neste caso concreto sei que o tempo não vai trazer nada de novo. Não espero, portanto, que a Dr.ª Ferreira Leite regresse à política para remediar as malfeitorias que já fez a muitos portugueses. Vai permanecer igual a si mesma, ou seja, dura e inflexível, para que seja tida na conta das pessoas sábias e competentes.

Cá por mim, condenava-a a recitar eternamente o acto de contrição e dispensava-a deste enorme sacrifício.

sexta-feira, maio 02, 2008

DO MEU DIÁRIO

Charneca da Cotovia, 1 de Maio de 2008 – Há, no actual governo da Lusitânia, um senhor de apelido Figueiredo, que é suposto tratar dos chamados funcionários públicos. Tratando-se de alguém que dirige e trata dos funcionários públicos, era natural que tivesse alguma simpatia por esse senhor, porque sou um desses funcionários de quem o senhor anda a tratar.

Acontece, todavia, que não tenho qualquer simpatia por esse senhor de apelido Figueiredo, o que não deixa de ser bizarro, porque, habitualmente, até gosto de alguns patuscos que nos governam. Gosto de um senhor de apelido Pinho e de outro de apelido Lino, que até não são patuscos, um que nos trata da economia e o outro das pontes, dos aeroportos e estradas maiores, que dos chamados caminhos vicinais tratam os presidentes de junta de freguesia. E deste senhor Lino confesso que até gosto muito e talvez o meu gostar radique naquela sua pronúncia da palavra francesa”jamais”, que significa jamais em português.

Eu sei porque não gosto do senhor de apelido Figueiredo e vou dizer porquê. É que o senhor esboça sempre um sorriso, mesmo quando anuncia coisas ruins. Eu até ponho de lado as percentagens que o senhor apresenta nos dias de greve; porém, dizer que é bom aquilo que todos dizem que é mau, é como se eu fosse a Fátima dizer, num dia treze de Maio, à hora das grandes celebrações, que a Nossa Senhora nunca andou por ali e que os santos pastorinhos eram uns putos com mentais perturbações; ou então, entrar num velório a arreganhar a sanfanfarrizófia, que eu não sei bem o que é arreganhar a sanfanfarrizófia, mas ainda hei-de saber, quando me lembrar de perguntar ao meu querido pai, que destas coisas sabe tanto ou mais que o nosso conhecido Francisco Torrinha.

Mas se calhar estou enganado, porque continuo arreigado a velhos princípios, quando tudo recomenda a adesão a princípios novos, ou melhor dizendo, renovados e em sintonia com a marcha inexorável dos tempos, como por exemplo o lambe-botismo, que eu não sei bem o que seja, porque nunca fui praticante, mas que vai grassando na área tutelada por este senhor de apelido Figueiredo. E quedo-me por aqui, com a seguinte pergunta:

QUE TERÁ TUDO ISTO A VER COM O 1º DE MAIO?