domingo, outubro 30, 2011

DO MEU DÁRIO


Santa Iria de Azóia, 29 de Outubro de 2011 – O principal responsável (?) pela governação de Portugal defendeu há dias o empobrecimento dos portugueses. É óbvio que nem todos os portugueses vão empobrecer; pelo contrário, há portugueses que vão enriquecer, e muito, com esta crise. Enriquecem os tubarões da finança e da distribuição; empobrecem os do costume, ou seja, aqueles que só dispõem do seu saber e do seu trabalho.


Um líder que ganhou eleições mentindo, apesar do piedoso Correia achar que se pode mentir, não deve merecer o respeito dos portugueses. Só um homem pequeno (do lat. pittinu) pode falar de empobrecimento do seu povo sem pestenejar. Como se pode dirigir um povo, conduzir um povo a bom porto, se o que se tem para oferecer é empobrecimento? Eu compreendo que se fale de sacrifícios, de austeridade, de poupança, etc., mas acho absurdo falar de empobrecimento. Nomeadamente, quando sabemos que há portugueses ricos, mais ricos cada dia que passa, a prescrever austeridade, poupança, sacrifícios e empobrecimento para a maioria dos seus concidadãos. Isto é inaceitável! Isto é indecente!


Na verdade, o principal(?) responsável pela governação, só o é aparentemente. O que é de estranhar é que se sinta bem no papel de executor das medidas prescritas pela”troika” e tudo faça para não desagradar àqueles homens sem alma e/ou às instituições financeiras que representam. Eu creio que por detrás daquele arzinho seráfico, há um político de direita, de direita pura e dura, que quer pôr o país a pão e água.


Eu creio firmemente que a “mansuetude” dos portugueses também tem limites. E creio ainda que nas horas difíceis que aí vêm, o PCP e a CGTP podem não ser os diques capazes de suster o descontentamento. A ver vamos.

sexta-feira, outubro 28, 2011

DO MEU DIÁRIO

Alqueva

61
Ontem passei por Mourão,
A caminho da albufeira.
Piquenique com leitão,
Pinga tinta de primeira.

62
Vir aqui comer leitão
Não casa lá muito bem.
Bom queijo, chouriço e pão,
Sim, e não choca ninguém.

63
Juro que tive saudade
Da sopinha de cação.
E também muita vontade
Do rico rancho de grão.

64
Vinho de Évora ao almoço,
De Reguengos ao jantar.
Um bom tinto mesmo moço
É de beber com vagar.



65
Oh, que bom estava o cabrito
Tão tenro e apaladado!
Com EA também levito,
Eu que tenho o pé pesado.

quinta-feira, outubro 27, 2011

NAMBUANGONGO

Ansiosos,
como loucos,
esperávamos a DO.

E quem não recebia carta
ou aerograma
ficava mais triste
e só.


Era a puta da guerra
- já sem guerra -,
no degredo
de Nambuangongo.

Lá,
onde até o céu
parecia mais alto
e inclemente.

Lá,
onde o napalm
devastara a paisagem
e matara gente.


(inédito)

GOSTA O POVO DESTA MALTA

Gosta o povo desta malta
De falajar fluido e forte;
Faz vénias aos da alta,
Aos do Sul e aos do Norte.

Vive sempre acocorado
Face à gajada do mando.
Fica em casa acagaçado,
Só reage de vez em quando.

Aceita o roubo e a pobreza
Como coisa natural.
E consente que a esperteza
Vá mandando em Portugal.

Venera beatos e santos
Aos quais roga protecção.
Adora rezas e prantos
E andar de chapéu na mão.

Um dia há-de acordar.
Precisa de um abanão
E aposto que há-de lutar
E à canalha dizer não.

terça-feira, outubro 25, 2011


CONTINUA O MUNDO DESCONCERTADO

Continua o mundo desconcertado,
Um mar de mentira e hipocrisia.
Desde Camões, pouco terá mudado,
Continua a mandar a vilania.

Os ricos, ousados e poderosos,
Ditam suas injustas leis ao mundo.
Incapazes de gestos generosos,
Tudo submetem ao dinheiro imundo.

Vivemos um tempo de submissão,
Que ignora princípios e valores.
O estudo, a probidade e a razão,

Deram lugar às cunhas e aos favores.
E assim corre a vida desta nação,
De engenheiros, bacharéis e doutores.

in FRAGMENTOS COM POESIA, Ulmeiro, Lx., 2005

segunda-feira, outubro 24, 2011

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 24 de Outubro de 2011 – Afinal de contas, alguns dos trastes, que mais têm defendido a austeridade e o rigor nas contas do Estado, andam a mamar impudicamente nas tetas da pátria, sem dó nem piedade. Cambada!


Afinal de contas, alguns dos que mais têm vociferado contra os subsídios de reinserção recebem os seus próprios subsídios de “reinserção” e sentem-se confortadíssimos com a protecção de leis que terão ajudado a fazer ou que foram feitas pelos seus amigos e correligionários. Não querem ouvir falar da iniquidade das mesmas e da sua consequente imoralidade. Cambada!


E depois vêm com a treta de terem prejudicado as carreiras e as vidas familiares. Não sabiam ao que iam. Pobres anjinhos! E alguns foram tão prejudicados, tadinhos, que são presidentes-directores-gerais das maiores empresas do país. Cambada!

domingo, outubro 16, 2011

É o tempo

dióspiros
romãs



I
É o tempo
- O inexorável tempo -,
Que atenua a mágoa
E mostra
Quão profundas
Eram as raízes.

II
Um Verão vai
E outro vem.
E neste vaivém,
Decorre
A minha vida.

Esta vida que vai,
Vai e não vem.

III
Lentas,
As nuvens vêm
E vão.

Umas deixam (m)água
E outras não.

Ah, só o Verão,
Esplendoroso,
Alegra
O meu coração.

O Outono,
Decididamente,
Não!



quarta-feira, outubro 12, 2011

DISCURSO


DISCURSO

Muitos de nós que temos mãos e temos pés,
muitos de nós que fazemos adeus aos comboios nas estações,
muitos de nós que passeamos o conformismo pelas ruas da cidade,
muitos de nós,
um dia,
talvez um dia,
saibamos quão inúteis foram os nossos braços,
as nossas pernas,
as nossas bocas,
os nossos ouvidos
e os nossos cérebros.


Talvez um dia,
quando violarem o silêncio da nossa inutilidade
e já for demasiado tarde,
vejamos então como eram irreais
os nossos primorosos raciocínios.


Nesse dia,
não haverá lugar para lágrimas
e lamentações.
Nesse dia,
morreremos como cães:
sem palavras,
sem sonhos,
acéfalos,
loucos.






4 QUADRAS

Uma quadra bem urdida,
Em dia de inspiração,
Pode, se for atrevida,
Causar dano até mais não.

Eu quero estar sempre a salvo
Dos efeitos de uma quadra.
Tiro certeiro no alvo,
Faz pior que o cão que ladra

Quatro versos podem ter
Um final devastador.
É por isso, ‘stá-se a ver,
Que a quadra exige rigor.

Em tempos de roubalheira,
Uma quadra pode ser
A espingarda mais certeira
Para os pilantras vencer
.

sábado, outubro 08, 2011

DO MEU DIÁRIO



Santa Iria de Azóia, 8 de Outubro de 2011 – Europeu por convicção, vivo o momento que a Europa atravessa com grandes apreensões. E dói-me, dói-me muito, ver este grande paquete transnacional a afundar-se, perante a impotência vesga de quem se encontra ao leme.




A Europa da senhora Angela Merkel não é a dos fundadores, que, na década de cinquenta, assinaram o Tratado de Roma e puseram o barco a navegar. Os fundadores, que tinham assistido ao espectáculo fratricida da 2ª Guerra Mundial, queriam agora paz e cooperação, solidariedade e bem-estar.




Estes trastes, que estão ao leme do gigantesco paquete, não têm grandeza nem cultura europeia para dar continuidade ao projecto inicial. Esta Europa que amo e sou é um barco à deriva, que Veneza, sempre ameaçada pelo tempo, há-de ver afundar-se, inexoravelmente.

terça-feira, outubro 04, 2011

ENTRE SILVES E GRANADA



Vivo com esta mania
Das moirinhas encantadas.
São restos da fantasia
Dos velhos contos de fadas.

Entre Silves e Granada,
Procuro as lindas gazelas.
Ò moirinhas de Granada,
Doces, amáveis e belas!

Nas margens do rio Arade,
Dou largas ao desvario.
Ò divina Sherazade,
Salta das águas do rio!

Em Silves, com Ibn ‘ Ammâr,
Queria, se pudesse ser,
De moiras tagarelar
E um vinho doce beber.

Al Mu ‘Tamid saudar
Com respeitosa emoção.
Poeta, mais devagar…
Ai, tanta divagação!

Isto é apenas a parte
Do que em Silves penso e sinto.
Oh, cidade prenhe de arte!
Oh, meu cálice de absinto!


in FRAGMENTÁRIA MENTE, Ed. Alecrim, 2009

Foto de José Baeta de Oliveira (Silves)