quinta-feira, abril 30, 2009

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 30 de Abril de 2009 – Parece-me que a pandemia mexicana, comummente conhecida por gripe suína, veio a calhar que nem ginjas para aliviar as tensões resultantes da grande crise em que a crise do “subprime” mergulhou o mundo.

Quem deve estar contente é o ministro dito do trabalho, que cá para mim foi sempre o ministro dos pobrezinhos, porque é o seu ministério que tutela os necessitados que tão abundantes são neste rectângulo desgraçado, onde uns quantos ricos e magnificamente instalados na vida não se cansam de prescrever medidas para tramar os tramados do costume.

Quem deve estar contente são os banqueiros e os gestores das abençoadas empresas públicas e dos monopólios, que enquanto o povoléu discute a pandemia porcina, não discute os seus prémios obscenos e as suas engenhosas engenharias financeiras, que colocaram o mundo à beira da desgraça e ainda têm lata para debitarem acerca da crise e enunciarem medidas para se superar a mesma.

Cá para mim, que só um simples homem do povo, que apenas reteve a palavra “subprime” quando a ouviu pronunciar pela tricentésima vez, essa corja deveria era ir pastar caracóis, o que, bem vistas as coisas, não era grande castigo para as suas incontáveis e indizíveis malfeitorias.

Cá para mim, um milhão de portugueses na rua, amanhã, comedidamente exaltados, mostraria a essa canalha, que Portugal é muito mais do que o país do faz-de-conta. Amanhã, celebra-se o dia do trabalhador. Amanhã é 1º de Maio!

quarta-feira, abril 29, 2009

ABRIL VAI PASSANDO

Abril vai passando, lento,
E com poucas emoções.
O país vive o momento
Dos pulhas e dos ladrões.

Meu Portugal videirinho,
Onde tanto se labuta,
Tudo metes no cuzinho
De certos filhos de puta.

Ergue a cabeça e explode,
Como naquele outro Abril
E verás que quem te fode
Vai de novo pró Brasil

Ou outro sítio qualquer,
Com a fortuna aumentada.
Até te leva a mulher,
Deixando-te cá sem nada.

sexta-feira, abril 24, 2009

O CRAVO NÃO MURCHOU

Dizer que o cravo murchou
É uma mera opinião.
Quem jamais Abril amou,
Não o traz no coração.

O meu cravo é encarnado
E vive dentro de mim.
Gosta de ser celebrado,
Sempre longe do jardim.

É o cravo da liberdade
que deu cor aquele Abril.
Hoje, é quase só saudade,
Mas fonte de esperanças mil.

quinta-feira, abril 23, 2009

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 23 de Abril de 2009 – Eu não sou muito dado a celebrações, porque as celebrações, nacionais e planetárias, são quase sempre uma forma de estimular o consumo. Hoje, no entanto, é um dia especial, porque se comemora o livro e eu tenho um particular afecto em relação aos livros.

E lá fui à bondosa FNAC, que hoje faz um desconto de vinte por cento em todos os livros, onde comprei um Saramago, o último, O CADERNO, um Jorge de Sena, SOBRE TEORIA E CRÍTICA LITERÁRIA, uma antologia de poetas espanhóis (Amalia Bautista, Luís Muñoz e Pablo García Casado), intitulada TRÍPTICOS ESPANHÓIS, organizada por Joaquim Manuel Magalhães, A LEVE TÊMPERA DO VENTO, que é uma antologia de poemas de Carlos de Oliveira, organizada por João Pedro Mésseder e, para terminar esta enumeração, OBRA POÉTICA (1972-1985) de Nuno Júdice.

Ainda perguntei por António Osório; mas, curiosamente, a bondosa FNAC não tinha nenhum António Osório disponível, facto que demonstra que não basta ser bom e grande. Osório não é Santos, nem Margarida, nem Júlia, nem Luísa. Osório é Osório. Ponto. E talvez por isso, não demorei mais de um quarto de hora na dita catedral do livro.

Até para o ano!


segunda-feira, abril 20, 2009

PARIS


Chamam-lhe a cidade luz,
Mas que luz tem a cidade?
Que fascínio seduz
Quase meia humanidade?

Oh, grande e bela Paris!
Oh, generosa cidade!
Não, não se engana quem diz,
Que deixas sempre saudade!

Um café no Luxembourg,
Descer o Saint Michel,
os faquires no Baubourg,
Namorar na Torre Eiffel.

Confesso que fui feliz,
No tempo que lá vivi.
Oh, doce e gentil Paris,
Como é bom gostar de ti!

sábado, abril 18, 2009

ANDA O POVO DEPRIMIDO

Anda o povo deprimido
Por causa da depressão.
Descobre no comprimido
Um meio de salvação.

Ou num copo de bom tinto
Abundante em Portugal.
Mesmo assim, inda pressinto,
Que não resolve este mal.

Isto, amigos, só lá vai
Combatendo a roubalheira.
E quem a pátria trai
Da forma infame e rasteira.

quarta-feira, abril 15, 2009

DO MEU DIÁRIO

Capela de S. Pedro

Lisboa, 15 de Abril de 2009 – De há muitos anos a esta parte, na segunda-feira de pascoela, a população da Mata desloca-se para o Largo da capela de S. Pedro e terrenos adjacentes, para o piquenique anual, que, de certo modo, também assume o carácter de romaria. Toalha no chão, farnel em cima e muito vinho dos “talheques” locais.

O piquenique não é uma verdadeira tradição – quando eu era miúdo, não se fazia -, mas é uma prática com mais de trinta anos e que se vai arreigando, na alma dos mais novos, e um dia há-de ser tradição.

Sempre apreciei os enchidos da Mata. E também os seus vinhos. Estes são produzidos sem recurso a quaisquer químicos. Na Mata, pode-se dizer, que ainda se bebe como a Natureza o dá. Pena tenho de já não poder alinhar nos desalinhos desta romaria popular.

Pró ano, se tudo correr bem, hei-de passar o S. Pedro na Mata. Até para me vingar de tantas e prolongadas ausências. E aqui fica uma quadra do folclore local:

S. Pedro, Senhor S. Pedro,
Quem vos varreu a capela?
Foram as moças da Mata,
Com raminho de macela.

segunda-feira, abril 13, 2009

DO MEU DIÁRIO

Moscavide, 13 de Abril de 2009 – Gosto de comer no Safari, que é um restaurante sobriamente burguês, onde venho, quase semanalmente agora, mas que frequento há mais de trinta anos.

O Safari já faz parte da História da minha família. Foi no Safari que a Zélia almoçou diariamente durante a gravidez da Filipa; e, talvez por isso – a História conta-se aos vindouros -, a minha filha sempre gostou de almoçar ou jantar neste restaurante de Moscavide.

Conheço os empregados e os donos, que sempre me trataram bem. Sei o nome de todos, como se todos habitássemos na mesma aldeia. Fomos envelhecendo em conjunto.

Em minha opinião, são estas pequenas coisas que criam os afectos e as raizes. Muito mais do que o cabrito de domingo ou o bacalhau com grão de segunda-feira.

domingo, abril 12, 2009

QUADRAS QUASE POPULARES

Eu amo este belo país,
Que espera quem não vem.
Terra de gente infeliz
De olhar vago e sempre aquém.

Obediente aos tiranos,
Pouco preza a liberdade.
Passa séculos e anos
Muito atido à caridade.

Um povo quer-se viril
E capaz de fazer frente
Aos que por maroscas mil
O querem triste e indigente.

Eu sei que não fico bem
Em tão severo retrato.
Azar. Português também,
Não mereço melhor trato.

quinta-feira, abril 09, 2009

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 9 de Abril de 2008 – A fotografia está-me na massa do sangue. Por isso mesmo, contam-se às centenas cá em casa. É uma forma outra de ir escrevendo as minhas memórias ou de guardar memória de objectos, sítios e pessoas, que, num dado momento, me disseram algo.

A convite da Alexandra, colaboro no “blogue” Duas Lentes, onde, um pequeno escol de fotógrafo(a)s amadore(a)s, publica fotografias de grande beleza, e, por vezes, originais e mesmo insólitas. No que me diz respeito, confesso que gosto da experiência, embora me falte a sensibilidade das colegas do “blogue”.

Graças a esta experiência, agora ando sempre munido de uma máquina para captar imagens, aqui e ali, que, à semelhança dos actos de fala, são momentos únicos e irrepetíveis.

DO MEU DIÁRIO

Lisboa, 8 de Abril de2008 – O meu pai, que nos deixou recentemente, percorreu, de bicicleta, as estradas dos conelhos de Castelo Branco e Idanha-a-Nova, para trabalhar na capital da Beira Baixa, Monforte da Beira, Ladoeiro, Zebreira, Alcafozes, Salvaterra do Extremo e muitas outras localidades que agora não me ocorrem. Não era um pedreiro ambulante, mas lutava pela vida, tentando ganhar sempre mais para fazer face à vida.

Lembro-me perfeitamente daquele homem pequeno e franzino, que partia às segundas-feiras, para voltar aos sábados à tarde – uns sim, outros não -, pedalando na sua velha pasteleira. Lembro-me de ir esperar o meu pai às Areínhas, sim, no sítio onde se corta para as granjas, que Maria João Pires celebrizou com o nome de Belgais, esperando sempre por um carinho e pelos inevitáveis chocolates espanhóis, que meu pai trazia, vindos de Zarza la Mayor. E caramelos muitos, também. E ceregumil para abrir o apetite, que, mais tarde, havia de ser devorador.

São estas memórias, e só estas, que fazem de nós seres únicos. Eu nunca agradeci devidamente estes pequenos gestos a meu pai, mas eu sei que ele sabia que eu nunca me esquecera dos seus inúmeros sacrifícios para me proporcionar alegria e felicidade. É por tudo isso que, quando o recordo, me surpreende uma lágrima comovida. Diariamente, ainda!

terça-feira, abril 07, 2009

DO MEU DIÁRIO

Forte da Casa, 7 de Abril de 2009 – A culpa das absolvições nos tribunais judiciais não é de Maria José Morgado e de Cândida Almeida. Tão-pouco do procurador-geral do ministério público. A culpa é de todo o sistema judicial portugês, que foi e é permeável à cunha, ao amiguismo e ao compadrio.

Maria José Morgado é apenas uma peça da pesada máquina da justiça, que, não raramente tem mão de chumbo para com os humildes, que condena a pesadas penas; e trata molemente os mais poderosos, não os investigando ou absolvendo-os. As excepções apenas confirmam a regra.

Já Cesário Verde, no Sentimento dum Ocidental, notava, ao passar em frente do Aljube ( ou do Lomoeiro?), que entre as reclusas não havia mulheres de dom. Assim continua a ser, hoje como ontem,

domingo, abril 05, 2009

DO MEU DIÁRIO

Cotovia, 5 de Abril de 2009 – Acontece-me, com alguma regularidade, sentir-me só, mesmo quando me encontro rodeado de uma multidão. E curiosamente, sentir-me bem acompanhado, na ausência de qualquer alma viva. Vá lá um homem perceber estas e outras contradições em que os seres humanos são férteis.

É verdade que sempre gostei de falar com os meus botões; nomeadamente, quando os que me rodeiam nada podem acrescentar àquilo que eu já sei. Gosto de conversar com quem tenha algo a aprender, porque eu aprendo sempre com a volúpia das crianças, ainda que tenha consciência de que, quando a grande ceifadora chegar, serei apenas um pouco menos ignorante.

Neste preciso momento, sinto-me acompanhado, sozinho, no silêncio deste meu refúgio da Cotovia, ou seja, nos cerca de vinte e oito metros quadrados da minha casinha pré-fabricada, e, tão modesta quanto eu, como cantou o Tim. Apesar da vozearia das crianças e dos progenitores, que enchem de vida o imenso parque de campismo.

Hoje, vou recomeçar a leitura do novo futuro romance de Vitor Morais, meu amigo, que me confiou a leitura há já vários meses, mas que circunstâncias várias me têm impedido de concretizar. O Vitor é um homem de muita qualidade, que escreve bem e é merecedor do meu mais vivo apreço. E estima.

sexta-feira, abril 03, 2009

DO MEU DIÁRIO

Lisboa, 3 de Abril de 2009 – Começa a ser surpreendente a capacidade de sobrevivência do primeiro-ministro de Portugal. Se vivêssemos em tempos de reis e rainhas, bem podia ter o cognome de “ O Sobrevivente”.

Sobreviveu à denúncia da forma atabalhoada como tirou o curso de engenharia – e logo engenharia! -; sobreviveu à história mal contada dos projectos de arquitectura (?); sobreviveu governando contra os mais desprotegidos e fingindo atacar as corporações; sobrevive com a embrulhada do Freeport.

Este homem que aprendeu a ler “teletexto”, mas que nunca terá lido com proveito um autor clássico, sobreviveu e sobrevive, porque Portugal nunca foi e não é um país de forte apego à justiça e às liberdades. Portugal gosta de ser governado com autoritarismo, mesmo que o protagonista até tenha voz de falsete. Foi assim com o contabilista de Santa Comba; é assim com o transmontano, que também gosta de ser beirão, que nos governa na actualidade.

E o mais dramático não é o homem sobreviver. O mais dramático é que parece agradar à maioria dos portugueses, que apenas sabe ousar, quando vota nesta gente e deposita fortunas na Dona Branca e no BPP.