Santa Iria de Azóia, 10 de Julho de 2012 – Não sei até onde recua a minha memória, mas creio recordar-me de factos de quando tinha três ou quatro anos de idade. Lembro-me, por exemplo, de estar todo o dia sentado junto de uma fogueira, enrolado num xaile de minha mãe, nos campos da Mata, enquanto os meus pais colhiam azeitona por conta de outrem.
Recordo-me de um certo dia, quando a minha mãe e outras mulheres “enfatulhavam” estacas – enfatulhar estacas consistia em enrolar palha molhada à volta de uma estaca que, se um dia viesse a singrar, seria uma estacazinha e posteriormente uma oliveira -, a tia Antónia Pereira me ter pedido um bocadinho de palha. Fui buscar palha à poça onde estava mergulhada em água, caí dentro da poça e só não morri afogado, porque a minha mãe estava sempre atenta. Passei essa manhã de primavera enrolado num avental de minha mãe à espera que a minha roupa enxugasse.
Durante o período da apanha da azeitona, acompanhava o meu pai e a minha mãe, a pé ou às cavalitas de meu pai, à chuva e ao vento, comendo pão com um bocadinho de conduto, que podia ser toucinho ou morcela, ovos fritos ou farinheira, uma talhada de queijo ou outra coisa qualquer, tudo com parcimónia, ainda que o pão, amassado e tendido por minha mãe, fosse sempre abundante. Lembro-me de uma vez, no couto do Firmino, mais concretamente na chamada Volta, ter caído a cesta de vime da nossa merenda e de eu ter gritado: “ai o nosso vinho!”. Durante muitos anos, os homens e as mulheres que assistiram à queda da cesta, lembraram-se com saudável gozo do grito “ai o nosso vinho!”.
Eu nem sei ao certo porque estou a escrever tudo isto, ainda que a vontade primeira fosse a de perguntar numa universidade qualquer, a quantas cadeiras teria direito, bolonhesas ou não bolonhesas, num curso de silvicultura ou de coisa parecida, se quisesse obter o referido grau académico. Mas há uma pergunta óbvia: “ para quê toda esta conversa da treta?”.
E por que carga de água se “enfatulhavam” as estacas? E concretamente o que eram as tais estacas?
Sem comentários:
Enviar um comentário