segunda-feira, junho 30, 2008

DO MEU DIÁRIO

Sacavém, 30 de Junho de 2008 – O rei de Espanha, ou das Espanhas, ontem, não tomou parte na peleja, em Viena. E nem sequer, através de um plebeu telemóvel, comandou as suas tropas. Delegou esta suprema competência no condestável Luís Aragonês, que dirigiu o minúsculo exército espanhol, que derrotou a poderosa Alemanha, mas que tinha igual número de guerreiros.

No final da batalha, que a Espanha ganhou com indiscutível galhardia, não havia baixas a lamentar e as bandeiras de Espanha foram saiotes e camisas que os moços vencedores ousaram usar com patriótica alegria.

O rei de Espanha, e de uma parte significativa dos espanhóis, porque há quem diga que os nossos “hermanos” são maioritariamente republicanos, ainda que “juancarlistas”, sem arnês, sem cavalo e sem lança ganhou a batalha; e, ao lado de Platini, cumprimentou, um a um, os vencidos e os vencedores, num gesto de grande magnanimidade.

Casilhas, o grande capitão, teve o privilégio de ser publicamente osculado pela rainha, grega como o Zorba, e que os espanhóis muito amam, num gesto provavelmente irrepetível. É que não é todos os dias que a grande poesia futebolística se exibe nos grandes palcos do mundo. Jorge Valdano deve ter vertido uma lágrima comovida.


sábado, junho 28, 2008

DO MEU DIÁRIO (NOTA AOS LEITORES)

Santa Iria de Azóia, 28 de Junho de 2008 - Provavelmente, o meu texto de anteontem, no qual dava conta do relançamento da PORTUGÁLIA, criou algum mal-estar entre os meus poucos leitores e amigos.
Retirei o texto, porque prezo a amizade acima de tudo; e, também, porque deixei claro, desde o início, que este "blogue" não seria o espaço da ofensa ou da pura maledicência. Creio que não disse nada de extraordinário acerca do poeta António Salvado, de quem não sou amigo, mas que conheço há décadas. Tenho por António Salvado, poeta, o maior respeito e admiração.
Quanto ao ter-se enterrado em Castelo Branco, acho que a metáfora, valendo o que vale, quer apenas significar o seguinte: se António Salvado não tivesse optado por viver em Castelo Branco, seria, seguramente, um poeta muito mais divulgado e conhecido a nível nacional. Os meios bem informados conhecem-no, mas não dão à sua obra o relevo merecido. António Salvado, na minha humilde opinião - e só enquanto poeta -, paga o preço da chamada interioridade.
Quanto ao resto, quis apenas dar importância ao facto de ter conhecido um homem jovem e dinâmico, em que, tal como em mim, o tempo decorrido, entretanto, deixou marcas profundas. Mas dizer isto, não será quase um lugar comum?
Agradeço os comentários do Anónimo, do Zé Ribeiro e da Maria José, que arquivei, no meu Diário.

sexta-feira, junho 27, 2008

SANTA IRIA DE AZÓIA

Vista do Castelo de Pirescoxe
Parque Urbano

Jardim de Via Rara


Jardim Ary dos Santos


A vila de Santa Iria
Até parece um jardim.
Antes de Abril, quem diria
Que havia de ser assim?

No centro do casario
Há um jardim bem tratado,
Onde ao vento, à chuva e ao frio,
Resiste Ary inconformado.

É na Xico Xavier
E tem árvores frondosas.
Sempre pronto pr’ acolher
As pessoas mais idosas.

O parque de Via-Rara,
É bonito o ano inteiro.
Obra cara? Muito cara,
Mas vale todo o dinheiro.

O inda moço Parque Urbano,
Onde era a grande lixeira,
Se não sofrer nenhum dano
Vai ser ‘spaço de primeira.

As árvores já plantadas
Hão-de boa sombra dar,
Pra quem fizer caminhadas
E lá quiser descansar.

Pirescouxe é um lugar
Com um bonito castelo.
E eu com tão pouco vagar
Pra fruir o puro belo.

O verde de tantos tons
Torna o sítio amoroso.
E há os canoros sons
Que me dão sossego e gozo.

Terra de trabalho e paz
Santa Iria sabe dar
Ao idoso e ao rapaz
Espaços para repousar.

quarta-feira, junho 25, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 24 de Junho de 2008 – Ainda que o “rendez-vous” estivesse marcado para o fim da manhã, levantei-me cedo. Levanto-me sempre cedo, quando os assuntos são inadiáveis e importantes. E de há algum tempo a esta parte, tudo me parece importante e inadiável.

Deixei a “Z”, em Sacavém, e rumei até ao Calvário, que, em princípio, seria o meu destino. Seria, mas não foi, porque decidi ir até ao Palácio Nacional da Ajuda, para visitar a exposição sobre a vida e a obra de Saramago, que tem por título “A CONSISTÊNCIA DOS SONHOS”.

Esta visita fazia parte dos meus planos e por várias razões, entre as quais destaco: gosto do autor, cuja obra conheço razoavelmente; gosto do autor, porque tem dado voz a grandes causas; gosto do autor por oposição a certa canalha que por aí pulula, em permanente guerra civil; gosto do autor que nunca renegou o seu passado e ainda sustenta que “ O pior do 25 de Abril foi o 25 de Novembro”; gosto do autor que foi o aluno n.º 599 da Escola Industrial Afonso Domingues, no ano lectivo de 1939-1940; gosto do criador de João Mau Tempo, Blimunda e Baltazar, Lídia e Marcenda, Marta Algor e muitos outros.

Como ainda não tenho a provecta idade de 65 anos, paguei, para ver, a módica quantia de três euros. A muitos outros dou pior aplicação.

segunda-feira, junho 23, 2008

DO MEU DIÁRIO

Lisboa, 23 de Junho de 2008 – Foi num dia 24, mais concretamente, no dia 24 de Julho de 1965, que um tal José de Sousa Saramago assinou um contrato com a Portugália Editora, tendo em vista a publicação da narrativa A Conta do Tempo.

Registe-se a coincidência do 24, que é dia de S. João, e façamos força para que amanhã seja um dia duplamente inaugural e venturoso, quer para a nova Portugália, quer para os seus autores. Nomeadamente, para o Daniel Abrunheiro, que neste recomeço vai publicar prosa.

FUTEBOL

Os moços do futebol
Amam muito Portugal
E adoram o carcanhol
Do Inter e do Real.

Eu não sou apaixonado
Pela lusa selecção,
Mas sofro sempre um bocado
Por cada eliminação.

Fazem dos putos heróis
Os jornais e a tel’visão.
Vão é pastar caracóis,
Que já nos sobra a ilusão!

Agora é que vai! É a hora
Por que Portugal anseia.
No final, tudo piora;
Lá se vai o pé-de-meia,

Que é esta capacidade
Pr’ acreditar e sofrer.
Meu Portugal, na verdade,
Não tem sina de vencer.

Vem um Scolari qualquer
E entrega-lha o coração.
A vontade de vencer
Vai-lhe turvando a razão.

sábado, junho 21, 2008

CANTIGA DE AMOR E SAUDADE

Por estes campos sem fim,
onde a vista assi se estende,
que verei, triste de mim,
pois ver-vos se me defende?


Todos estes campos cheos
são saudade e pesar,
que vem para me matar
debaixo de céus alheos.
Em terra estranha e em ar,
mal sem meo e mal sem fim,
dor que ninguém entende,
até quam longe se estende
o vosso poder em mim!


Sá de Miranda, POESIAS ESCOLHIDAS, Ed. Sá da Costa

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 21 de Junho de 2008 – Problemas vários do foro pessoal têm-me impedido de escrever, ou de tentar escrever, com a regularidade habitual. Tudo se há-de recompor e a normalidade há-de vir para ficar.

Terça-feira, o Daniel descerá à grande cidade para a apresentação urbi et orbi do seu romance Terminação do Anjo, que, espero, seja um ponto de partida para uma profícua carreira nas letras em língua portuguesa. Irei à Sá da Costa para testemunhar a minha camaradagem e o quanto acredito no Daniel.

Cultivo a amizade como quem pratica uma religião. Assim ao jeito de um certo Tahar Bem Jelloun.

terça-feira, junho 17, 2008

DO MEU DIÁRIO

Na sessão de lançamento, Bar Património, Castelo Branco
Rebuçados, Caramelos & Sonetos

Na sessão de Lançamento de Rebuçados, Caramelos & Sonetos¹, o seu autor, o poeta João de Sousa Teixeira, que já poderia ter comemorado trinta e cinco anos de vida literária, abordou a sempre interessante questão das catalogações, recusando a sua pertença a qualquer movimento ou corrente. E na verdade, penso que é difícil atribuir um “ismo” qualquer a este poeta, que iniciou a sua carreira, se é que assim nos podemos expressar, no longínquo ano de 1972, com RO(S)TOS DO MEU PAÍS. Porém, a epígrafe inicial do livro, colhida no alfobre de Nicolau Tolentino de Almeida e um soneto intitulado “Alexandre O’Neil”, parecem constituir uma pista para a feitura de uma árvore genealógica, que, creio, João de Sousa Teixeira não desdenharia.


Já alguém catalogou João de Sousa Teixeira como o poeta do “coisismo”, numa recensão a Alegria Incompleta², na revista “Colóquio Letras”. Confesso que não me agrada aquele vocábulo, ainda que compreenda as razões de Fernanda Botelho. Tal como Cesário Verde, que os seus contemporâneos não chegaram a conhecer, este poeta albicastrense encontra a sua matéria-prima no real, e, à semelhança do poeta oitocentista, confere dignidade poética a coisas e temas que, habitualmente, andam arredados da poesia. Um dos sonetos deste livro tem mesmo o título “Cesário Verde” e tal não terá acontecido por obra do acaso.


A ironia e o sarcasmo, abundantemente documentados em Rebuçados, Caramelos & Sonetos, constituem como que a matriz de toda a poesia de JST. Atente-se, a título de exemplo, no poema “ACTO(R) POLÍTICO, que aqui deixo reproduzido e veja-se como o anafórico “um” (pág.12), numa espécie de charada, corresponde a um longo e veemente torcer o nariz àqueles que se dedicam à política:


ACTO(R) POLÍTICO


Um mau actor não é um bom político.
Um mau político não é um bom autor
Um bom actor não é um mau político.
Um bom político não é um mau autor

Um bom político é um bom autor.


Notas (1) Edição de rvjeditores, Castelo Branco, Junho de 2008.
(2) Vega, Lisboa, 1988.


segunda-feira, junho 16, 2008

SILVES


Vou a Silves este Verão
Pra subir o rio Arade.
Vai ser grande a emoção
Quando chegar à cidade,

Onde Al Mu’tamid, poeta,
Cantou as lindas gazelas
E com carinhosa seta
D’amor feriu muitas delas.

Quero andar pela cidade
E auscultar-lhe o coração.
Que esta moura ainda há-de
Dar-me, alegre, a sua mão.

Há-de ser neste Verão,
Que eu já morro de saudade.
Meu amor virou paixão,
Bela paixão, na verdade.

domingo, junho 15, 2008

DO MEU DIÁRIO

Centro da cidade
Castelo Branco, 15 de Junho de 2008 – A Mata é cada vez mais uma obsessão. Não, não é só o facto dos meus pais ainda lá viverem. Pressinto assim como que um chamamento, uma vontade enorme de ir e permanecer, a necessidade daqueles sons e odores. No fundo, ir à Mata é o reencontro com a minha natureza mais profunda.

O lançamento do livro do João Teixeira, Rebuçados, Caramelos & Sonetos, decorreu dentro daquilo que era espectável: uma apresentação condigna a cargo da Professora Maria de Lurdes Barata e meia dúzia de palavras do autor, dentro daquele seu jeito já tão antigo e peculiar. Esperava ter encontrado por lá mais algumas caras conhecidas.

Quem não faltou foi o Carlos Vale e o Xico Zé, que, como é hábito, teimam em primar pela presença nestes eventos. Também são estes actos de camaradagem que conferem sentido e espessura humana às nossas vidas. Há, na verdade, mais vida para além da política, ainda que esta se insinue em todos os nossos actos.

O Bar Património, ali paredes-meias com a Praça Velha, é um espaço simpático e parece-me adequado para eventos desta natureza. Pele leitura atenta da bibliografia, verifiquei que o João não publicava versos, em livro, desde 1991, ainda que Mar de Pão, de 2003, seja uma belíssima narrativa, onde o lirismo e o épico andam de mãos dadas.

Constatação das constatações: o tempo voa, meus senhores!




sábado, junho 14, 2008

JOÃO DE SOUSA TEIXEIRA

Decorreu esta tarde, a apresentação do livro de poesia Rebuçados, Caramelos & Sonetos, da autoria de João de Sousa Teixeira, no Bar Património, em Castelo Branco. A apresentação esteve a cargo da Professora Doutora Maria de Lurdes Barata.
Aqui fica um poema, em três andamentos, ainda que não tenha pedido "com licença" ao autor e à RJVEditores:
TRÊS POR TRÊS
OITAVA MARAVILHA
Eis como a oitava maravilha se anuncia:
a quinta emenda, a sexta esquadre
e o heróico sétimo de cavalaria.
COMUNIDADE EUROPEIA
As voltas que nós demos por este passaporte.
Agora, é só seguir a boa estrela, que, se deus existe,
há também uma CEE para além da morte.
AS NÓDOAS
Umas são negras (como no dorso das andorinhas)
outras têm cores tão angelicais,
que sem óculos tridimensionais, não adivinhas.
Do livro falarei, quando o ler com a devida atenção.

sexta-feira, junho 13, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 13 de Junho de 2008 -Compartilho da opinião de que a oposição, na sua totalidade, deveria ser veemente na condenação dos camionistas, que, usando e abusando da sua força efectiva, puseram a nu a fraqueza do poder legítimo do país, quer gostemos dele, quer o detestemos. Muitas foram as vozes que se ergueram neste sentido.

Porém, seguindo a lógica da responsabilização da oposição, também os governos – nomeadamente quando detém maioria absoluta -, deveriam chamar mais vezes a oposição a dar o seu contributo para a feitura das leis e para a resolução dos problemas do país. Aquando das manifestações dos professores, os paladinos da responsabilização assobiaram para o lado. E para o lado assobiam, quando estão em causa direitos fundamentais dos trabalhadores.

Dir-se-ia que se usa de dois pesos e duas medidas, quando a questão é mais séria e o regime fica mais vulnerável. Descobre-se então, subitamente, que a oposição deve colaborar na busca de soluções, e, sobretudo, condenar as acções que possam pôr em causa o poder instituído. É uma visão totalitária do problema, porque não está provado, nem jamais será provado, que este modelo de regime nos há-de governar até ao fim do mundo. Mormente, quando alguns dos detentores do mando usam este a seu bel-prazer, espezinhando os mais fracos, subtraindo-lhes direitos arduamente conquistados. E tudo em nome de um deus sem princípios, mas efectivamente maior, que dá pelo nome de mercado.

Não me venham com a treta de que nada há a fazer no comércio dos combustíveis. Vontade houvesse para refrear os especuladores parasitas e outro galo cantaria. Mas esta é a lógica deste totalitarismo outro em que efectivamente vivemos, globalmente falando.

quinta-feira, junho 12, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria (vista do castelo de Pirescoxe)


Oeiras, 9 de Junho de 2008 – José Gomes Ferreira, Zé Gomes para os amigos, completaria hoje a bonita idade de cento e oito anos. Nasceu a 9 de Junho de 1900, na Rua das Musas – o que não deixa de ser premonitório –, na cidade do Porto. Mas cedo veio para Lisboa e foi na capital do reino – nesta cidade a quem o Tejo, lambe os pés, ternamente –, que se fez Homem e um dos poetas mais peculiares do seu tempo.

Eu revisito amiúde os poetas e os prosadores que mais amo ou amei. E José Gomes Ferreira, de quem tenho toda a poesia publicada, em mais do que uma edição, encontra-se no rol dos meus eleitos. Nunca chegámos à fala, apesar de o ter esperado durante horas, na Sociedade Recreativa e Musical 1º de Agosto Santa Iriense, no final dos anos setenta do século passado, para uma sessão cultural dedicada à literatura. Viria de Alhandra, a toureira, no dizer bem-humorado de Garrett, mas não veio. Do grupo só apareceu Arquimedes da Silva Santos, grande homem, médico e poeta, que pertenceu ao grupo do Novo Cancioneiro. E que tem vivido sempre na Póvoa de Santa Iria, no incontornável concelho de Vila Franca de Xira.

E tudo isto, para vos dizer que nasci 52 anos, exactamente cinquenta e dois anos, depois de José Gomes Ferreira. Numa segunda-feira, já o sol ia alto, no dizer de minha mãe.

Dia de chuva, curiosamente
!

segunda-feira, junho 09, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 9 de Junho de 2008 – Minha mãe, naquela sua voz doce, dizia-me:”Hoje fazes anos, filho”. E eu fazia anos. E a vida corria, com as brincadeiras quotidianas, quase sempre as mesmas, sem festas ou quaisquer outras manifestações familiares ou de amigos. No fundo todos fazíamos anos e ninguém fazia anos, no sentido em que hoje se faz anos.

E nem por isso a minha infância foi menos feliz. Ainda hoje oiço a vozearia dos rapazes e das raparigas da minha aldeia, onde nada acontecia, para além das nossas brincadeiras pueris, tais como o eixo-ribaldeixo, a raposinha e as corridas com arcos ou com as jantes velhas das velhas pasteleiras.

E o tempo fluía, sem festas nem abundâncias, mas plácido e feliz, no nosso mundo, que era pouco mais do que as duas ruas e as nove casas do poema do Manuel da Fonseca.




domingo, junho 08, 2008

DO MEU DIÁRIO

Charneca da Cotovia, 7 de Junho de 2008 – Gosto muito do desporto, em geral, e, do futebol, em particular. Porém, nunca o futebol se há-de sobrepor, na minha mente, aos grandes problemas com que a sociedade portuguesa se debate, no momento que passa. Nomeadamente, os decorrentes das chamadas grandes reformas deste (des) governo e que passam por um ataque em forma e em força aos direitos dos trabalhadores portugueses, que tanto custaram a conquistar, antes e depois de Abril de 1974.

No momento em que o (des) governo do senhor eng.º parece estar encurralado, após a manifestação de quinta-feira passada, em Lisboa, e a marcha dos camionistas, ontem, na cidade do Porto, o fenómeno desportivo vai jogar a favor do ministro dos pobrezinhos, do chefe do ministro dos pobrezinhos, do senhor Vitalino Canas e do senhor Lelo e também do senhor Alberto Martins, que serão todos pessoas muito estimáveis, uns mais do que outros, mas eu aqui não quero meter o bedelho, porque quem os conhece bem é o senhor Manuel Alegre.

Ora dizia eu que o fenómeno futebol vai jogar a favor do governo, porque as televisões, todas sem excepção, dão mais importância ao futebol e às manas do Cristiano Ronaldo e à dona Meira e à dona Sabrosa e às outras donas, que acabam por ter mais protagonismo que Maria Cavaco Silva, cujo marido teve a honra de receber os craques do chuto na bola, em cerimónia no Palácio de Belém, como se a ida à fase final do campeonato da Europa de futebol fosse o desígnio dos desígnios nacionais. Eu estou mesmo convencido de que Vasco da Gama não teria cobertura televisiva tão abundante, se televisão já houvesse, naquele ano de 1497, 7 Julho, quando partiu para a Índia.

A vitória desta noite sobre a Turquia vai fazer esquecer os verdadeiros problemas nacionais e o senhor eng.º vai pedir aos seus santinhos todos, transmontanos e beirões, para que ajudem Portugal a vencer a República Checa, na próxima quarta-feira, porque as televisões trar-nos-ão narrativas e mais narrativas de gosto duvidoso, contribuindo para a alienação da lusa gente. E assim, enquanto largos milhares de portugueses se vão manifestar contra as políticas ruinosas dos sucialistas; outros manifestar-se-ão para celebrar os feitos desportivos da selecção comandada pelo brasileiro Scolari.

Já é quase uma da manhã. Da televisão chega-me a notícia de que a selecção está a chegar a Neuchatel e que é esperada por cinco mil portugueses. Já que não podem atirar com boas marcas de relógios nacionais à cara dos suíços, há que chateá-los com barulho e com os festejos da vitória frente à Turquia. Cantem-lhes mil vezes a “Portuguesa”, assim como quem grita, aquela parte do “às armas!”, “às armas”, que até pode acontecer que se borrem todos e fujam para outro cantão qualquer e os portugueses possam conquistar e fazer portugueses o cantão e a cidade de Neuchatel.

O fenómeno não é exclusivo dos portugueses. É europeu. É um sinal dos tempos que correm. Infelizmente.



sexta-feira, junho 06, 2008

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 6 de Junho de 2008 – Afinal de contas, o senhor primeiro-ministro é uma pessoa sensível. Não o será a muitas coisas, mas é-o a algumas e isto basta para o excluirmos da categoria dos caras-de-pau.

Ontem, duzentos mil portugueses manifestaram-se, em Lisboa, contra a versão socialista do Código do Trabalho, contra o pacote anti-funcionários públicos, nomeadamente. E por acréscimo, contra esta política ruinosa para o mundo do trabalho. Que as políticas têm sempre beneficiários e vítimas.

Desde Novembro de 1975; portanto, há trinta e três anos, que os sucessivos governos, ora o do Sancho Pança, ora o do Sancho Pança, ou coisa que os valha, que governam sistematicamente contra os trabalhadores, num contínuo aterrador. A pedido dos patrões, os (des) governos da ditosa pátria elegeram sempre como vítimas os mais fracos.

Ficámos a saber, embora saibamos que é despudorada mentira, que ao ministro dos pobrezinhos tanto impressiona uma manifestação de mil como de um milhão de manifestantes. Nós sabemos que não é bem assim, mas uma vez feito o mal, este fica feito e as costas da responsabilidade política são muito largas.

E nós que queríamos crer que este senhor Vieira da Silva era melhor do que alguns dos outros!

Quanto ao chefe do ministro dos pobrezinhos, ficámos a saber que não é sensível a manifestações mas sim a argumentos. Balelas!!! Que mais argumentos quererá o senhor, para concluir que as suas políticas são ruinosas para o país?

Aos duzentos mil de ontem, em Lisboa, duzentos mil se seguirão, dia 28, por Portugal inteiro. Porque é de portugueses inteiros que se faz um Portugal inteiro. Este Governo, eleito por uma maioria, neste momento é um governo de facção. È o governo dos ricos e dos poderosos.

quinta-feira, junho 05, 2008

ANTONIO MACHADO

GALERÍAS
POEMA LXXIX

Desnuda está la sierra,
y el alma aúlla al horizonte pálido
como loba famélica. Qué buscas,
poeta, en el ocaso?
Amargo caminar, porque el camino
pesa en el corazón. ¡ El viento helado,
y la noche que llega, y la amargura
de la distancia !... En el camino blanco
algunos yertos árboles negrean ;
en los montes lejanos
hay oro y sangre… El sol murió… Qué buscas,
poeta, en el ocaso?

terça-feira, junho 03, 2008

NUM INVERNO FRIO, EM BRAGA

5 QUADRAS
A Frei Perdigão


Num Inverno frio, em Braga,
Causou-me admiração
Ver sem meias e em sandálias
O rijo frei Perdigão,

Que ouvia com atenção
Os relatos das doenças
E abria seu coração
Sem pensar em recompensas.

Preparava aloés vero
Com tal carinho e rigor
Que vi no bom frade austero
Um retrato do Amor.

Feita a singela mistura
Dava sábias receitas,
A quem procurava a cura
De pavorosas maleitas.

Um dia, a Braga irei
Visitar Frei Perdigão.
Quando? Ainda não sei.
Num dia de Inverno, não!


segunda-feira, junho 02, 2008

FEDERICO GARCIA LORCA

CANCIÓN DE JINETE

CÓRDOBA.
Lejana y sola.

Jaca negra, luna grande,
y aceitunas en mi alforja.
Aunque sepa los caminos
yo nunca llegaré a Córdoba.

Por el llano, por el viento,
jaca negra, luna roja.
La muerte me está mirando
desde las torres de Córdoba.

¡Ay qué camino tan largo!
¡Ay mi jaca valerosa!
¡que la muerte me espera
antes de llegar a Córdoba!

Córdoba.
Lejana y sola.