quinta-feira, setembro 29, 2011

PARA ONDE CAMINHA A ESCOLA PÚBLICA

Escola da Mata, remodelada e mais acolhedora.

Santa Iria de Azóia, 29 de Setembro de 2011 – Eu frequentei a escola primária da Mata, no concelho de Castelo Branco, entre 1959 e 1964. Era uma escola com uma fachada típica do Estado Novo, com duas salas, uma destinada às meninas e outra aos meninos. Com muro ao centro, a dividir o espaço dos recreios.


No fundo, com aquela divisão por géneros, podia-se falar com propriedade de duas escolas, que só comunicavam através de um espaço com duas portas, onde os professores guardavam a lenha para consumir nas lareiras. No telheiro, onde nos abrigávamos do frio e do calor, porque nós íamos para a escola cedinho para acabar os trabalhos, os actuais TPC, e brincar, havia instalações sanitárias, que só eram utilizadas pelos professores e por alguma menina com estatuto. No entanto, éramos nós, os alunos, que bombeávamos a água da cisterna para um depósito, que depois havia de levar os excrementos para uma fossa.


No inverno, as lareiras funcionavam; porém, se algum calor produziam era apenas para os alunos mais próximos e para os professores, ela sempre de mantilha pelas costas e ele de sobrepeliz. E nós, mal enroupados, a bater o tarau, arreganhados, muitas vezes incapazes de escrever. E se calhar era por isso que cada professor tinha a sua régua de madeira para dar reguadas aos alunos, mormente aos que davam mais erros no ditado e erravam mais contas. Eu, uma vez, levei uma surra, que até andei de rastos dentro da escola, mas gritei, gritei, gritei, que a minha mãe até terá ouvido os gritos. Ficou-me desse tempo esta disposição para gritar e nomeadamente as injustiças.


As necessidades fisiológicas eram feitas numa tapada com alguns hectares, propriedade dos professores, que tinha algumas oliveiras ranhosas e era propícia, naquela época, ao cultivo do trigo. Pedia-se licença para ir fazer as necessidades e lá íamos nós, ora os rapazes, ora as raparigas, baixar as calças e levantar os vestidos. Um nojo, claro, vistas as coisas com os olhos de hoje, mas que naquele tempo era normal. Electricidade só depois do 25 de Abril, que também havia de trazer o saneamento básico à aldeia.


Esta manhã ouvi notícias sobre cortes na educação. E falava-se mesmo no corte de despesas de electricidade, aquecimento e outras. Fiquei aterrorizado. Lembrei-me da escola da Mata, não a do projecto Belgais de Maria João Pires, mas a minha, onde passei frio e tinha de ir fazer as necessidades na tapada dos professores. Cheira-me mal. Que país é este?

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