CASTELO BRANCO
Naquele ano de 1972, em Castelo Branco havia aqueles dois senhores, que eram da PSP e trajavam à paisana: um era o senhor Pudico e o outro era o senhor Outro. Tinham por missão zelar pelos costumes e impor o respeitinho. Visitavam o subversivo Vidal, que vendia muita prosa vil e acolhia perigosos homens do contra: o alfaiate Matos Pereira, o industrial Armindo Ramos e o advogado João Vieira. E outros, que o quiosque estava licenciado e a entrada era livre (o computador topa os anacolutos).
O senhor Pudico usava gabardina, no Inverno, como o inspector Colombo (Peter Falk) de uma série televisiva, e chapéu todo o ano, por respeito à convenção. O senhor Outro, já não me recordo se tinha gabardina, mas também usava chapéu. E óculos para poder ver melhor os títulos subversivos, que um tal Vilhena teimava em publicar: O Filho da Mãe, Marmelada, A Vaca Borralheira, As Canetas dos Amantes, etc. E quedo-me por aqui para não alongar o rol.
O senhor Pudico e o senhor Outro, que levavam a sua nobre missão a sério,
eram pessoas muito sós, porque, lá bem no fundo, só se tinham um ao outro. A cidade olhava-os com desdém, porque o senhor Pudico e o senhor Outro eram o retrato vivo da vigilância, num país vigiado até nas coisas mais simples e íntimas.
O senhor Pudico e o senhor Outro não liam livros; apreendiam livros. O senhor Pudico e o senhor Outro não conversavam; ouviam conversas. O senhor Pudico e o senhor Outro não viviam; andavam por ali, enquanto a cidade vigiada trabalhava, lia e conversava.
Naquele ano de 1972, em Castelo Branco havia aqueles dois senhores, que eram da PSP e trajavam à paisana: um era o senhor Pudico e o outro era o senhor Outro. Tinham por missão zelar pelos costumes e impor o respeitinho. Visitavam o subversivo Vidal, que vendia muita prosa vil e acolhia perigosos homens do contra: o alfaiate Matos Pereira, o industrial Armindo Ramos e o advogado João Vieira. E outros, que o quiosque estava licenciado e a entrada era livre (o computador topa os anacolutos).
O senhor Pudico usava gabardina, no Inverno, como o inspector Colombo (Peter Falk) de uma série televisiva, e chapéu todo o ano, por respeito à convenção. O senhor Outro, já não me recordo se tinha gabardina, mas também usava chapéu. E óculos para poder ver melhor os títulos subversivos, que um tal Vilhena teimava em publicar: O Filho da Mãe, Marmelada, A Vaca Borralheira, As Canetas dos Amantes, etc. E quedo-me por aqui para não alongar o rol.
O senhor Pudico e o senhor Outro, que levavam a sua nobre missão a sério,
eram pessoas muito sós, porque, lá bem no fundo, só se tinham um ao outro. A cidade olhava-os com desdém, porque o senhor Pudico e o senhor Outro eram o retrato vivo da vigilância, num país vigiado até nas coisas mais simples e íntimas.
O senhor Pudico e o senhor Outro não liam livros; apreendiam livros. O senhor Pudico e o senhor Outro não conversavam; ouviam conversas. O senhor Pudico e o senhor Outro não viviam; andavam por ali, enquanto a cidade vigiada trabalhava, lia e conversava.
2 comentários:
Muito engraçado.
A censura, um mal que perdura...
Beijinhos.
Olá Sofia,
Tempo nublado em Sesimbra, esta manhã.
Pois é! É por isso que vou buscar estes textos mais antigos.
Beijinhos.
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