sexta-feira, outubro 03, 2008

MEMÓRIA

CASTELO BRANCO 2

E havia aqueles dois senhores,
que eram da PSP e trajavam à paisana:
um era o senhor Pudico e o outro era o outro.
Tinham por missão zelar pelos costumes
e impor o respeitinho.
Visitavam o subversivo Vidal,
que vendia muita prosa vil
e acolhia perigosos homens do contra:
o alfaiate Matos Pereira,
o industrial Armindo Ramos
e o advogado João Vieira.
E outros, que o quiosque estava licenciado
e a entrada era livre.

O senhor Pudico usava gabardina, no Inverno,
como o inspector Colombo de uma série televisiva,
e chapéu todo o ano, por respeito à convenção.
O outro, já não me recordo se tinha gabardina,
mas também usava chapéu. E óculos
para poder ver melhor os títulos subversivos,
que um tal Vilhena teimava em publicar:
O Filho da Mãe,
Marmelada,
A Vaca Borralheira,
As Canetas dos Amantes, etc.
E quedo-me por aqui para não alongar o rol.

O senhor Pudico e o senhor outro,
que levavam a sua nobre missão a sério,
eram pessoas muito sós,
porque, lá bem no fundo, só se tinham um ao outro.
A cidade olhava-os com desdém,
porque o senhor Pudico e o senhor outro
eram o retrato vivo da vigilância, num país vigiado
até nas coisas mais simples e íntimas.

O senhor Pudico e o senhor outro não liam livros.
apreendiam livros.
O senhor Pudico e o senhor outro não conversavam.
ouviam conversas
O senhor Pudico e o senhor outro não viviam,
andavam por ali,
enquanto a cidade vigiada
trabalhava, lia e conversava.

6 comentários:

João de Sousa Teixeira disse...

sabes, Manel, que um dia apreenderam a Larousse ao "pobre" do Vidal. Quando Chegaram à esquadra foram descompostos pelo comandante, mas mesmo assim, ainda argumentaram: LA... Russe, capas vermelhas... hummm, isto é subversivo!...
Um já morreu, o outro não faço ideia. Eram o patilhas e o ventoinha. Pobres diabos...
Um abraço, Manel

Manuel da Mata disse...

João,
Eu não sabia dessa, mas tem pernas para andar.
O senhor Pudico, era pai de um indivíduo da nossa idade ou um pouco mais velho. É Pudico pela ironia e ... Percebes?
Eu tinha quase pena dos pobres diabos.
Gostava de saber o que tu pensas destes textos. Eu não ando a exorcizar coisa nenhuma, mas deu-me para aqui.
Achas que o Luís me dá uma boleia, na questão da cpa?
Abraço,
Manuel

João de Sousa Teixeira disse...

Tá bem, eu digo:
Freixo e Vaz eram os seus nomes, que diabo, não faz mal dizer os nomes destes energúmenos infelizes.
Tinham ambos filhos da nossa idade, que são vivos. Um deles tem negócios em Espanha (Vaz) e o outro "diz" que é técnico de não sei quê na TVI, mas como é mentiroso, deve ser mecânico de automóveis em Oeiras...
Quanto aos textos, só penso que lhe devias tirar a aperência de poema. Quanto ao conteúdo, olha, vai dando para conversarmos...
Abraço
João

Manuel da Mata disse...

João,

Penso que um deles se chamava Pelica. O outro, que era o mais alto nunca soube o nome. Talvez tenhas razão, porque sempre estiveste mais tempo lá e conhecias mais gente.
Os textos vão continuar assim, porque também não vejo outra forma de os estruturar em termos visuais. Estão a meio caminho de várias coisas e dá para conversarmos, o que já não é pouco.
Abraço.

Manuel da Mata disse...

João,

Penso que um deles se chamava Pelica. O outro, que era o mais alto nunca soube o nome. Talvez tenhas razão, porque sempre estiveste mais tempo lá e conhecias mais gente.
Os textos vão continuar assim, porque também não vejo outra forma de os estruturar em termos visuais. Estão a meio caminho de várias coisas e dá para conversarmos, o que já não é pouco.
Abraço.

João de Sousa Teixeira disse...

Não, o pai do Pelica é outra conversa. Sobre esse, que faleceu há pouco tempo, falaremos depois...
Referi-me a dois outros, não a esse.
Um abraço
João