Lisboa, 7 de Março de 1994 -Portugal é hoje um país de répteis. Não admira, assim, que a traição espreite a cada esquina. Os portugueses sempre foram mesquinhos e interesseiros. E nada dói tanto como a ausência de grandeza. Portugal começou a agonizar, com efeito, ainda na primeira metade do séc. XVI. Inelutavelmente, caminha para a dissolução final. E sobretudo, porque nunca mais soube encontrar alternativas credíveis e atempadas. Hoje, agarra-se e chupa a teta da mãe Europa com quantas forças tem. O pior virá, quando a teta, sugada até ao tutano, deixar de ser o almejado D. Sebastião.
Curiosamente, a religião fez-nos grandes e pequenos. Com o mito de cruzada dominámos metade do mundo; a Inquisição parece ter-nos castrado para sempre.
1 comentário:
A velha era viúva de há tanto tempo, que a memória já não chegava para saber quanto. Queria agora aliviar o luto, embora mantendo o mesmo respeito pelo defunto. Foi por isso à drogaria vizinha e pediu:
- Ó Senhor Manuel, venda-me um pincel pequeno e uma latinha de tinta preta, que não seja muito escura, para retocar a campa do meu marido.
Não é o caso da anciã, que era respeitadora, decrépita, é certo, mas honrada. É mais o de certa gentinha que por aí anda a fazer-nos crer que o preto é branco e vice-versa.
Na verdade, nada daquilo que vemos diariamente é o que na realidade nos contam termos visto; nada do que sentimos na pele é aquilo que nos dizem termos sentido; nenhumas das cores que vemos são as cores com que nos pintam a vida. Nas escolas, nos hospitais e centros de saúde, nos serviços públicos, no emprego e, enfim, na praça ou na mercearia.
Montados nos cavalos do sucesso e das saídas airosas, os ministros falam agora da inevitabilidade e da globalização de medidas austeras, quando há poucos meses os sacrifícios seriam mínimos e poucos os sacrificados. A crise estava então erradicada.
A estes juntaram-se agora outros, pintando a manta. É mais do mesmo. Como se a crise e o nosso anunciado desassossego tivessem apenas a ver com a redução do IVA de alguns produtos essenciais, a suspensão das parcerias económicas do estado ou o encerramento de instituições paralelas, que os sucessivos governos foram criando para agraciar os respectivos boys pelos serviços prestados.
As contribuições sérias; quando realmente a vida da maioria das pessoas está em causa, aqueles não as querem ver nem pintadas.
Os figurões, esses, chegam mesmo a falar de mágoa que sentem por terem de aplicar as medidas “impopulares” que nos comprometem o futuro. Hão-de voltar mais tarde com o mesmo discurso, com caras de anjo e cores celestiais.
A banca, obreira de todo este desastre económico e financeiro, que especulou, esbanjou e agiu, em muitos casos fraudulentamente, é agora o sector a proteger, a acarinhar e a incentivar, mais parecendo vítima daqueles que não têm emprego, recebem salários e pensões de miséria, compram os medicamentos mais caros e engrossam as filas dos bancos alimentares.
É, portanto, a cor do dinheiro, que comanda a nossa vida cinzenta.
Abraço
João
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