Santa Iria de Azóia, 13 de Agosto de 2012 – Marcelo Rebelo de Sousa, a quem Pedro Santana Lopes já apelidou de “pregador de domingo”, é um comentador isentíssimo, que, domingo após domingo, vai trazendo a luz aos nossos espíritos sempre muito propensos às trevas. Eu por mim estou agradecidíssimo a esta eminência, que, com aquele irrequietismo ainda quase juvenil, me surpreende sempre com os seus brilhantes pensamentos.
Vem este meu aranzel a propósito da celebração de ontem e relativamente a uma situação comezinha, que tem a ver com a vontade do executivo de conceder mais cinco dias de licença para férias aos funcionários do fisco. Que não acha bem e sobretudo pelo ruído que a medida pode produzir e porque os ditos funcionários já têm outras regalias. Não ocorreu ao distinto académico discorrer sobre dois ou três factos relevantes, que aqui deixo à consideração dos meus leitores.
Um funcionário do fisco pertence, tal com o académico deveria saber -ou convir-lhe-á fazer que não sabe? - a um mundo complexo, onde nem sequer há o princípio da especialização. Funcionário do fisco tem de saber IMI, LGT, BF, IVA, IR, IUC, etc. No entanto, a administração não fornece os meios indispensáveis ao estudo, a tempo e horas; e, quando os fornece são manifestamente insuficientes, obrigando os funcionários a adquirir códigos anotados e outros materiais, para poderem desempenhar melhormente a sua actividade profissional. Chefe de Finanças que se preze gasta muito dinheiro em publicações. E os restantes funcionários também.
O catedrático também não disse que os funcionários do fisco têm um regime de incompatibilidades, que os impede de exercerem outras actividades, renumeradas ou não, sem prévia autorização da tutela. Nomeadamente a docência, que, curiosamente, é permitida aos dirigentes em horários normais, mas que aos funcionários comuns, quando muito, só em horário pós-laboral. Se aos professores catedráticos fosse imposto um regime semelhante, este universitário talvez não pudesse cantar assim de galo.
O académico também ainda não ouviu dizer, por exemplo, que o fisco está a vender casas diariamente, colocando famílias no olho da rua. O distinto catedrático não sabe nada do desespero de quem está em vias de perder o seu tecto. Não, ainda não ouviu falar. Nem ouviu falar de casos de agressão física e verbal aos sobreditos funcionários, que são o pão nosso de cada dia. Meter tudo no mesmo saco não me parece uma atitude séria, porque aos funcionário das execuções fiscais de um serviço de finanças não lhe correm os dias placidamente como à generalidade dos comentadores-tudólogos. E depois, os cinco dias só premiavam os funcionários excelentes.
O popular professor tem razão. Esta coisa ia fazer ruído; porém, nunca pelas razões que apresentou. Daria ruído, porque um excelente em Vila Velha de Ródão pode ser um medícre em Lisboa e um excelente no Porto pode ser um medícre em Alfândega da Fé. Corria-se o risco de tornar a medida muito controversa.
Feito este interim, vou continuar a ler o meu Camilo.